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São Paulo, segunda-feira, 14 de julho de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A tribuna de Lula em Londres

MARCO AURÉLIO GARCIA

A reconstrução da economia brasileira, para produzir, pela primeira vez na história, crescimento com distribuição de renda e democracia, exige muito mais do que as medidas de saneamento da pesada herança macroeconômica deixada pelo governo anterior. Para vencer a vulnerabilidade externa, principal problema econômico do país, faz-se necessária também uma presença forte e soberana do Brasil no mundo.
Além da articulação sul-americana, das iniciativas em direção à África e ao mundo árabe e da intensificação das relações Sul-Sul, a serem aprofundas no segundo semestre, o presidente Lula garantiu sua presença nos principais foros internacionais.
Esteve com seus companheiros de sempre em Porto Alegre, em janeiro deste ano. Viajou a Davos, onde lançou as bases de uma nova agenda internacional, centrada no combate às desigualdades sociais no mundo. Reiterou e ampliou esse discurso na cúpula ampliada do G8, em Evian. Agora, ele comparece à reunião de cúpula da Governança Progressista, nos arredores de Londres.
A reunião do que antes foi chamado de Terceira Via tem suas peculiaridades vis-à-vis os demais eventos citados. Trata-se de um encontro de chefes de governo centrado em questões de natureza política, reunindo dirigentes que supostamente compartilham uma mesma perspectiva doutrinária. Seus organizadores pretenderam originalmente juntar os pedaços de uma social-democracia em crise, mas ampliada a ponto de incluir Bill Clinton.
O presidente Lula considerou que a tribuna da Governança Progressista, como outras, oferece a oportunidade não só para vocalizar as posições do novo governo brasileiro, como a de outras forças políticas do Sul empenhadas na construção de um mundo multipolar, democrática, econômica e socialmente justo.
O partido do presidente não se inclui na linhagem de muitas das organizações aí presentes. O PT integra uma nova geração de partidos, pós-comunista e pós-social-democrata, confrontada com os desafios de construir sociedades democráticas, socialmente igualitárias, mas também de mudar a atual correlação internacional de forças, profundamente desfavorável aos países situados na periferia do capitalismo globalizado.


O PT integra uma nova geração de partidos, confrontada com os desafios de construir sociedades democráticas


O fato de a agenda do Brasil, assim como a da Argentina, do Chile ou da África do Sul, cujos presidentes também comparecem à reunião, ser diferente daquela dos países desenvolvidos presentes no evento não impede que a interlocução se estabeleça.
Para o Brasil, o tema das desigualdades sociais tem prioridade sobre as importantes questões de segurança, até porque o enfrentamento destas últimas está em muito condicionado à resolução das primeiras.
A tese do direito de intervenção para proteger direitos civis, suposta ou realmente violados em qualquer parte do mundo, não pode justificar, como aconteceu na Guerra do Iraque, a violação da soberania nacional, menos ainda quando desconhece a ONU e o direito internacional.
A luta contra a proliferação de armas nucleares, biológicas e químicas deve ser acompanhada do empenho pelo desarmamento global, não sendo criadas exceções para as grandes potências.
Buscar convergências, sem deixar de explicitar diferenças e divergências quando necessário, tem sido a marca da atuação internacional do Brasil depois de 1º de janeiro deste ano.
A posição altiva e soberana de Lula em Washington, Davos, Evian e Londres mostra que o governo não busca confrontos, mas que não cede na defesa de seus princípios e do interesse nacional.


Marco Aurélio Garcia, 62, professor licenciado do Departamento de História da Unicamp, é assessor especial de Política Externa da Presidência da República. Foi secretário de Cultura do município de São Paulo (gestão Marta Suplicy).


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