São Paulo, quarta-feira, 14 de julho de 2010

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ANTONIO DELFIM NETTO

Probabilidades

As opiniões dos analistas sobre a evolução da conjuntura oscilam pendular e rapidamente do otimismo cauteloso ao pessimismo defensivo.
Mark Twain disse uma vez que agradecia ao bom Deus ter-nos criado ignorantes e que se alegrava quando alguém desafiava os Seus planos a esse respeito, mas devia fazê-lo por sua própria conta e risco.
Tomar risco significa apresentar análises e prognósticos que possam ser rejeitados pelos fatos dentro de um horizonte de tempo delimitado.
Por exemplo, é vazia a proposição que "a economia corre agora o risco de sofrer uma recaída ("double dip") com a probabilidade maior do que 50%". Sem dizer "quando", nunca será rejeitada pela experiência.
A mesma coisa se aplica às análises de cenários "alternativos" (de fato contrafactuais) aos quais se atribuem probabilidades: o cenário A, onde tudo dá certo, tem probabilidade de 20%; o B, onde o câmbio se desvaloriza, tem probabilidade 50%; e o C, onde o câmbio se desvaloriza e a taxa de juro real sobe, tem 30%.
Mas 20%, 50% e 30% de quê? Como dar sentido físico e operacional a tais estimativas subjetivas, por mais competentes que sejam seus autores? E como controlá-las "ex post facto"?
A originalidade desta crise é que ela foi construída nos países desenvolvidos. Para mitigá-la eles substituíram a demanda privada pela demanda pública, envolvendo-se em enormes desequilíbrios fiscais.
O duplo problema é mais complexo do que parece porque ele só pode ser resolvido com um crescimento econômico mais robusto.
Se a retirada da demanda pública não for compensada pela volta da demanda privada, o PIB cairá e os deficit e a dívida/PIB continuarão a crescer.
A solução alternativa de aumentar os impostos debilitará ainda mais o setor privado, reduzirá a produtividade do sistema econômico e a taxa de crescimento, sem nenhuma garantia de que o desequilíbrio fiscal seja, de fato, eliminado.
A única solução plausível é a de um ajuste fiscal crível, inteligente e bem calibrado, capaz de construir expectativas positivas que darão oportunidade à recuperação do "espírito animal" dos empresários e estímulo ao emprego.
A teoria econômica sugere e a história revela muitos casos de choques fiscais acompanhados de desvalorização cambial bem-sucedidos. Eles produziram uma expansão do PIB entre 18 e 24 meses pela retomada da demanda privada interna e externa, ao mesmo tempo em que resolveram o problema fiscal.


ANTONIO DELFIM NETTO escreve às quartas-feiras nesta coluna.
contatodelfimnetto@uol.com.br


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