São Paulo, Sábado, 14 de Agosto de 1999
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LOCAUTE NO CAMPO

O país assistirá nos próximos dias, ao que parece, a outra tentativa de um grupo altamente organizado de extrair favores e concessões duvidosas do Planalto. Os ruralistas prometem um caminhonaço em Brasília.
As ameaças não param na mobilização do protesto, de resto legítimo numa democracia se ficar nos limites da ordem e não ferir direitos alheios.
Algumas lideranças, mais inflamadas, convocam o setor a uma forma peculiar de locaute, abandonando o campo, negando-se a plantar. A pressão consistiria em comprometer a meta oficial de ampliar a produção de grãos, ameaça que seria levada a efeito se os produtores não obtiverem do governo um farto perdão de dívidas.
Naturalmente, é muito difícil que tais ameaças cheguem a se concretizar. Mas, como iniciativa política, são altamente demagógicas e apenas tornam mais discutíveis as reivindicações postas sobre a mesa.
O governo já ensaia a contradança habitual quando lida com interesses organizados e com forte poder de pressão no Congresso: como que se prontifica a ceder. O ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, teria sido orientado pelo Planalto a "não esticar demais a corda".
O custo para o Tesouro Nacional, ou seja, para o restante da sociedade, das benesses reivindicadas pelos ruralistas, é estimado pelas suas próprias lideranças em até R$ 8 bilhões (calculados os impactos apenas nos cinco primeiros anos).
A justificativa para não pagar dívidas, como sempre, é apresentada de forma curiosa: seria uma condição para o desenvolvimento do setor agrícola. No entanto, argumento dessa espécie valeria para todos os setores da economia e para todos os países do mundo. Mas é óbvio que, se fosse aplicado de forma supostamente equânime, perdoando-se todas as dívidas, quebraria o sistema financeiro público e privado.
Não é aceitável que uns poucos se beneficiem da generosidade oficial nos termos em que estão sendo pleiteados. Tal generosidade teria um custo que, aliás, só aumentaria o sacrifício da maioria silenciosa.


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