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NELSON MOTTA
Cordiais saudações
RIO DE JANEIRO - A famosa
"cordialidade brasileira", supostamente uma qualidade nacional, é
uma das principais armas da quadrilhagem parlamentar, presente
em todos os partidos, para dominar
o Congresso.
A idéia do brasileiro como "homem cordial", do sociólogo Sérgio
Buarque de Hollanda, é freqüentemente distorcida e associada ao jeitinho, ao jogo de cintura e ao sentimentalismo barato: o brasileiro visto como um ser humano simpático,
afetuoso, solidário, sempre disposto a buscar o entendimento, e não o
conflito.
É apenas empulhação, um álibi
para toda sorte de banditismo,
compadrio e corporativismo, porque a característica do "brasileiro
cordial" de Sérgio Buarque é ser levado mais pelo coração (cor, cordis,
em latim) do que pela razão. Para o
bem e para o mal. Muito mais para o
mal do que para o bem, como se vê.
No caso, é a arma mais eficiente
desses malditos políticos que infelicitam o Brasil e se perpetuam no
poder: a simpatia, a cordialidade, a
lisonja, o puxa-saquismo, o bom-mocismo, a disposição de ajudar os
amigos contra a lei, a dividir segredos e trapaças, a tolerar transgressões em nome da amizade ou da
"causa", a infinita capacidade de
fingir esquecer ofensas, traições e
humilhações em nome dos altos interesses nacionais... É dura a vida
desses cordiais.
Renan Calheiros é um arquétipo
cordial. Educado, respeitoso e tolerante com seus pares, sempre pronto a um favor, a uma cortesia, desinteressadamente, é claro, um homem que não guarda mágoas de adversários, que sabe esquecer e perdoar... Em suma, um fofo, um queridão, um boa-praça -condição indispensável aos piores trapaceiros
para melhor dar seus golpes.
É essa cordialidade que absolve
Renan e condena o Senado à vergonha e ao desprezo.
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