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CARLOS HEITOR CONY
Ricos e pobres
RIO DE JANEIRO - Cito de memória: "Para os ricos, só existe um
caminho para a conservação de sua
fortuna: é se apoderar do Estado". A
frase é de Lorenzo de Médici, exemplo de citação obrigatória do grande
príncipe renascentista.
Não era, exatamente, um político. Sua cabeça, e sobretudo o seu
coração, estavam direcionados para
as artes, daí seu nome ser sinônimo
de mecenas. Mas as complicações
da cidade-Estado, somadas às rivalidades das grandes famílias, obrigaram Lorenzo a aceitar o poder
aos 20 anos. Talvez para explicar
essa guinada em sua vida ele deixou
a frase com que se inicia a crônica.
Para os ricos, é impossível evitar
o poder, uma vez que é o poder que
garante a própria riqueza e cria possibilidades de ampliá-la. É evidente
que não é um pensamento bonito,
mas é real, pragmático e elucidador:
é assim até hoje.
Na recente campanha sucessória,
percebeu-se a vigilância do poder
econômico sobre o poder político.
Antigamente, as coisas eram mais
veladas. Ricos e poderosos procuravam disfarçar -senão escamotear- as influências que exerciam
sobre o processo eleitoral. Hoje, as
coisas são mais visíveis, ocorrem a
céu aberto.
A constatação leva à conclusão de
que o Estado, no fundo, é um instrumento que sempre esteve e estará a serviço dos já poderosos. Para
derrubar essa situação, de tempos
em tempos, são feitas as revoluções
e, vitoriosas, criam a nova classe de
poderosos, que continuará por cima da carne-seca.
Por essas e por outras, o anarquismo pretende acabar com o Estado, mas até hoje não se criou o
equivalente que funcione. O jeito é
tudo permanecer como está.
Aos ricos, as batatas. Aos pobres,
restará o consolo de servir ao Estado dos ricos. E receber o Bolsa Família como prêmio por bom comportamento.
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