São Paulo, sábado, 15 de janeiro de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O Executivo deve sancionar um salário mínimo maior que R$ 540?

NÃO

Congresso novo, farsas velhas

ROBERTO LUIS TROSTER

A proposta do Legislativo de elevar ainda mais o salário mínimo é um deboche. A tramitação do projeto do Orçamento teve componentes de ilusionismo econômico.
Aumentou-se a estimativa das receitas em R$ 25 bilhões, sugerem uma alta de alguns gastos no Orçamento, incluindo um valor maior do salário mínimo e destinam R$ 20 bilhões para emendas específicas.
Em números redondos, estimam que cada brasileiro vai pagar R$ 125 adicionais em tributos, para aumentar o salário mínimo em R$ 20 além da proposta original, e destinam R$ 100 a emendas dos próprios parlamentares.
Lembrando que, no passado, algumas dessas dotações específicas para entidades sem fins lucrativos foram escandalosamente fraudulentas. Sem sentido.
Existem outras três razões básicas para não aumentar o salário mínimo além dos R$ 540. A primeira é econômica. Embora o quadro conjuntural apresente fatores positivos, como uma taxa de crescimento elevada, há sinais dissonantes que exigem cuidados, como a dinâmica de juros, câmbio e preços.
A alta dos gastos públicos aumentou a pressão inflacionária, obrigando o Banco Central a subir os juros. Atraindo, dessa forma, capitais especulativos, que valorizam o dólar e tiram competitividade da indústria nacional. Quanto mais alto for o salário mínimo, maior será a expansão fiscal. O momento exige um pé no freio, que, quanto mais rápido for, mais curto será.
A segunda razão é que um salário mínimo nominal mais elevado, na atual conjuntura, tem um efeito fraco no ganho real de renda.
Quanto maior for a inflação, menor será o poder de compra do salário mínimo, e quanto mais baixo for o crescimento, menos oferta de novos empregos haverá. O que se quer é um aumento duradouro da renda real dos mais pobres, e não apenas nos primeiros meses deste ano.
O terceiro motivo, o mais importante, é o sinalizador sobre o estilo da política econômica atual.
O discurso do Executivo foi de um comprometimento com o futuro, anunciando a intenção de cortar desperdícios e buscar eficiência nos gastos públicos. Embora não se espere uma mudança radical, não faz sentido uma volta a um populismo anacrônico, com o Congresso anunciando gastos incompatíveis com as urgências do país.
É uma aspiração de toda a sociedade brasileira uma melhoria no rendimento das classes mais baixas. O que deveria estar sendo discutido é que tipo de medidas deveriam ser adotadas para aumentar o salário mínimo real ao longo de toda a década, e não apenas em 2011. A miopia e o improviso na política econômica custam caro.
O Congresso que saiu o fez em clima de fim de festa. Votou, em um dia apenas, um aumento de 60% no salário dos legisladores.
Cada um dos mais de 500 deputados vai receber um contracheque superior a R$ 26 mil, além de auxílio moradia, assessoria, telefonia e passagens de avião.
Esse despautério gerou um efeito cascata em Estados e municípios. Um desrespeito com eleitores.
As manchetes dos últimos dias mostram de maneira contundente a importância de planejar o futuro.
O que está acontecendo em algumas cidades, Teresópolis em especial, mais que resultado da chuva, é consequência de baixos investimentos em infraestrutura e de improvisações na ocupação do espaço urbano. Abundam exemplos em outras áreas da necessidade de construir o futuro do Brasil. O Congresso que entra pode contribuir agindo com responsabilidade.

ROBERTO LUIS TROSTER, consultor, é doutor em economia pela USP. Foi economista-chefe da Febraban, da ABBC e do Banco Itamarati.

E-mail: robertotroster@uol.com.br.

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