São Paulo, quarta-feira, 15 de fevereiro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A reinvenção do Brasil

LINDOLFO PAOLIELLO

Eliezer Batista resolveu falar o que todos nós precisávamos ouvir há muito tempo. Meninos levados, eternamente folgando e rindo, como observou Pero Vaz de Caminha, primeiro cronista do Brasil, era mesmo preciso alguém que fez e deu certo nos dar esse puxão de orelha. Enquanto isso, no dizer que somos capazes de fazer o melhor, abrindo e construindo nosso próprio caminho a partir do entendimento de que nosso primeiro desafio é alcançar as verdadeiras dimensões dos desafios que nos são oferecidos.


Temos diante de nós o pensamento pronto de quem sempre advertiu que "as matérias-primas não são, elas se tornam"


A lição está aí, ao alcance de quem se prestar a ler e a aprender, e os autores da façanha são Luiz César Faro, Carlos Pousa e Cláudio Fernandez, que fizeram o que é preciso fazer com pensamentos e obras de valor: reunir, editar e difundir. Desse esforço, que não deve ter sido fácil, devido à teimosia do personagem central em se manter em mineiríssimo silêncio, nasceu "Conversas com Eliezer", proporcionando, como resultado para quem sonha o Brasil, uma bruta saudade do futuro.
Para quem leva uma boa reprimenda, ajuda a ficar vivo saber de quem a está levando. Eliezer Batista é um construtor de sonhos e é hoje, certamente, a pessoa com melhor visão integral do Brasil como ele é e como deve ser.
Se é possível uma síntese de sua obra, pode-se tentar resumir como sendo, com rara sensibilidade, economicidade e determinação, ter formulado e posto em prática a concepção sistêmico-holística do projeto mina-ferrovia-porto-navio e consumidor final. Com esse sonho, construiu sua catedral, um incrível complexo logístico que inclui a concepção e desenvolvimento da Companhia Vale do Rio Doce como referência mundial no segmento da mineração.
Dela partiu para uma obra grandiosa de integração nacional e de conexão do Brasil com o mundo, em um ímpeto de criação e capacidade de construir que soma façanhas como a estrada de ferro Vitória-Minas, os portos de Tubarão e Sepetiba, o projeto Carajás, uma nova concepção de navios graneleiros, a Docenave, a CST, o apoio fundamental a Azevedo Antunes no desenvolvimento da MBR, a abertura do mercado japonês para o Brasil e a "costura" da colaboração entre os dois países, a disseminação da cultura do gás em nosso país e, enfim, uma obra tirada do fundo do coração: Pedra Azul, no Espírito Santo, misto indecifrável de sítio e núcleo de cidadania, onde todos lêem, escrevem, têm saúde e buscam, juntos, a felicidade.
Mas o que importa e faz a diferença em Eliezer Batista é o seu compromisso com o Brasil. A ponto de ser arriscado, observando suas referências afetuosas e às vezes emocionantes à sua esposa, Jutta, afirmar qual foi seu maior amor.
No entanto é curioso constatar como foi decisiva a paixão dos dois pelo Brasil (sendo ela alemã) para as contribuições concretas de Eliezer Batista com vistas à reinvenção deste país.
Parte da percepção e denúncia de gargalos estruturais, desdenha dos "fundamentalistas da moeda" e propõe a integração do respeito ao Orçamento e à moeda ao crescimento da economia física. Trazendo à tona uma visão geopolítica atual e lúcida, armazenou um impressionante arsenal de ferramentas para o desenvolvimento, que, na sua concepção, deve tomar como base a integração econômica, interna e externa. Dá destaque à formação de "belts", grandes cinturões de desenvolvimento econômico, ao longo de rodovias ou ferrovias, tirando proveito de investimento feito na logística e aproveitando vocações econômicas competitivas locais.
Enfim, temos agora diante de nós o pensamento pronto, embora não acabado, do homem que sempre advertiu que "as matérias-primas não são, elas se tornam". Convém ouvir Eliezer Batista.

Lindolfo Paoliello, 59, é jornalista, consultor de comunicação e presidente do Conselho de Política e Estratégia da Associação Comercial de Minas. É autor dos livros "O País das Gambiarras" e "Banquete dos Mendigos", entre outras obras.


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