São Paulo, segunda-feira, 15 de março de 2004

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VINICIUS TORRES FREIRE

Horror, horror, mídia e política

SÃO PAULO - Quase nunca conhecemos nomes e rostos dos mortos em massacres, em campos de extermínio, dos assassinados por terroristas, pelas turbas armadas de facões, das vítimas das limpezas étnicas, das prisões de ditaduras e democracias, das guerras sujas e das guerras limpas, as "cirúrgicas".
É tão óbvio, são tantos e tão freqüentes os mortos assim. Aqui no Brasil, soubemos o nome de um patrício ferido na carnificina de Madri. Vimos vidrados o rosto da mulher morta e sem nome nas ferragens do trem de Atocha, Madri, os lábios abertos, olhos transidos, como se fosse desmaiar de dor.
Pouco sabemos dos 8.000 bósnios mortos em Srebrenica, dos tutsis de Ruanda e Burundi. Nada sabemos dos massacres africanos, asiáticos, latino-americanos. A empatia é para quem se parece conosco, vive como a gente, ou quase sempre para quem vive em lugares que têm poderes e haveres bastantes para fazerem suas histórias terríveis serem midiáticas.
Mas ao lado das pessoas horrivelmente mortas em Madri merece epigramas e elegias tanta gente mais.
Os milhares de hemas e biras massacrados, por vezes à razão de centenas por dia, no Congo.
Ou Dilawar, 22, e Mullah Habibullah, mais ou menos 30, torturados e mortos na base aérea americana de Bagram, em dezembro de 2003, no Afeganistão, segundo os próprios patologistas militares americanos.
Ou as centenas, talvez milhares, de israelenses mortos quando comiam um pizza ou um sanduíche numa cafeteria universitária. Palestinos atropelados por tanques, tratores e metralhas do Exército de Ariel Sharon.
Os colombianos assassinados pelo narcoterror, tantos, tão aqui do lado, mas que nos parecem tão exóticos ou tanto com o nosso povo miúdo que nem ligamos para seus massacres.
Os milhares de argelinos massacrados pelo terror islâmico. Os sudaneses cristãos e animistas. A Libéria. Serra Leoa. O Timor Leste.


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