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JOÃO SAYAD
Rigoletto
Aqui, do lado ocidental, não há
ninguém preso por crime de opinião. Há prisioneiros sem culpa formada em Abu Ghraib e em Guantánamo e um magnata do petróleo preso
na Rússia, mas a Rússia não é ocidental. E o desgraçado Jó brasileiro, que ficou 19 anos preso por engano, sai cego
da prisão, recompensado com R$
1.200 por mês.
Nenhum caso de prisão de intelectual, escritor, poeta, jornalista ou qualquer dissidente por crime de opinião.
Nenhum marquês de Sade preso em
nenhuma Bastilha.
É uma má notícia. Apesar de tanta
insatisfação, não conseguimos escandalizar, nem criticar, nem renovar,
nem propor nada que ameaçasse as
idéias da nossa época.
A América Latina tem uma coleção
de novos presidentes eleitos pela insatisfação. Chávez, na Venezuela, Tabaré, no Uruguai, Morales, na Bolívia, e,
possivelmente, Obrador, no México, e
Alan Garcia, no Peru. A situação perde as eleições depois três anos de crescimento rápido e estabilidade macroeconômica. A frase célebre "é a
economia, estúpido" deveria ser substituída por "é a exclusão, estúpido".
Nos Estados Unidos é igual. O presidente Bush perde popularidade e o
apoio do Partido Republicano. Os democratas não sabem o que propor como plataforma política para entusiasmar o eleitor americano. Continuamos estacionados no fim da história.
Em São Paulo, na semana passada, a
reunião internacional de ombudsmans de jornais criticou a qualidade
das notícias sobre a nacionalização do
petróleo e do gás na Bolívia.
Os jornalistas não são culpados, pois
até os analistas políticos se limitaram a
definir e falar mal dos populistas, mas
não conseguiram explicar o que aconteceu. Os novos presidentes são populistas apenas porque foram eleitos em
protesto, mas não sabem como se livrar das amarras das instituições e dos
mercados, que tornam as suas medidas inócuas ou desastradas. Carecem
de estratégia ou de reflexões que possam tornar efetiva a insatisfação que
representam.
Aqui nesta Folha, na semana passada, lemos que analistas financeiros
mudaram a previsão do crescimento
do produto de 3,50 % para 3,51%. As
previsões de inflação foram alteradas
de 4,36% para 4,33% ao ano, como se
o produto e a inflação pudessem ser
medidos em nanômetros. O absurdo
não é culpa dos jornalistas nem dos
economistas. É o espírito da nossa
época.
No passado, reis despóticos tinham
sempre ao lado um bufão bem alimentado e bem pago apenas para falar a verdade e criticar o rei e os seus
desmandos. Era o guardião da liberdade de expressão, subsidiado pela
coroa, e cujo poder real era inabalável.
As críticas faziam apenas cócegas no
rei, que ria junto com os nobres áulicos esparramados ao redor do trono.
A inflação vai cair 0,03% (0,0003 em
números absolutos) neste ano, e o
produto vai crescer 0,01 % (0,0001) a
mais do que o previsto. A taxa de juros média prevista para este ano passou de 15,28% para 15,23%. A taxa
cambial será de R$ 2,10 por dólar.
Protestamos com a liberdade dos bufões -é um absurdo! Arrogantes ou
entediados, os donos do poder ouvem
e sorriem suavemente.
João Sayad escreve às segundas-feiras nesta coluna.
jsayad@attglobal.net
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