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Regular as agências
Envolvimento da Anac e da Anatel em negócios "estratégicos" põe em xeque autonomia que é essencial para o modelo
O MODELO de agências
reguladoras para arbitrar entre interesses
dos consumidores e
das empresas na operação de
serviços públicos, um legado das
privatizações dos anos 1990, representa um avanço institucional. Poucos contestam o mérito
de um sistema em que instituições públicas autônomas zelem
pela concorrência e pelas regras
de atuação em setores com alta
concentração de capital.
Já a atuação real das dez agências nacionais é outra história. A
existência da Aneel (energia elétrica), a primeira a ser criada
(1996), não impediu o apagão de
2001. A transformação do Departamento de Aviação Civil em
Anac, a última (2005), tampouco
evitou o apagão aéreo de 2006-2007. Ao contrário, há evidências de que esta debacle decorreu
da inapetência da Anac para arrostar desmandos e impor ordem num sistema desarranjado
por duas tragédias seguidas.
O depoimento da ex-diretora
Denise Abreu na Comissão de
Infra-Estrutura do Senado sobre
o caso Varig demonstra com clareza que ocorreu a temida "captura" da autoridade reguladora
por interesses privados -exatamente o que uma agência deveria prevenir. Pior, essa ingerência se mistura a pressões do Poder Executivo, com o agravante
de um dos interessados no negócio obscuro ser compadre do
presidente da República.
É inegável que as agências foram importantes na modernização de setores inteiros, como a
ANP (petróleo) no desmonte
parcial do monopólio da Petrobras. Também se reconhecia o
profissionalismo da Anatel (telecomunicações) na gestão do período pós-privatização. Mas até
ela parece estar em risco com a
obsessão do governo Lula em
promover negócios dados como
estratégicos, a exemplo da compra da Brasil Telecom pela Oi.
O impasse entre seus quatro
conselheiros sobre a transação
só foi superado após o Planalto
ameaçar com a indicação de um
conselheiro substituto. A mudança dos votos de conselheiros
que antes faziam restrições demonstra que a autonomia da
agência foi atropelada. Ganha
vulto, com tais episódios, o receio de que as agências caminhem para se tornar verdadeiros
balcões de negócios.
É preciso rever o modelo das
agências. Não para retirar-lhes
atribuições, como pretendia o
projeto de lei 3.337 alinhavado
pelo então ministro José Dirceu
em 2004, mas sim para salvar o
que lhes resta de independência.
Urge aperfeiçoar o processo de
escolha dos dirigentes, hoje prerrogativa do presidente da República que resulta de modo invariável em indicações políticas. Se
o Senado descumpre sua obrigação de sabatinar indicados para
avaliar sua competência técnica,
devem-se introduzir exigências
formais, como a comprovação de
experiência prévia no setor, ou
mesmo cogitar o recurso a comitês de busca para circunscrever a
arbitrariedade presidencial.
A pretexto de elevar o controle
público, o Planalto atua para mudar de fato e de direito o balanço
de poder entre agências e Executivo. O interesse da sociedade,
porém, vai na direção oposta.
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