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MELCHIADES FILHO
O livro dos espíritos
BRASÍLIA - O golpe de 1964 teve
"espírito democrático". A censura à
imprensa foi "condição para o progresso". As cassações políticas,
uma "necessidade" ante a "intransigência" do único partido de oposição (MDB) que a ditadura permitia existir na década de 70.
É espantoso, mas o dinheiro público ainda financia o ensino desses disparates no país. Como revelou a Folha no domingo, estão no
livro de história usado nos colégios
militares, com quase 15 mil alunos.
Pior, o Exército faz questão que
os estudantes paguem por esse material didático, quando poderiam
receber, de graça, outros livros de
história credenciados pelo MEC.
É grave, portanto, o descaso do
governo. O Ministério da Defesa
promete acionar "autoridades competentes". A Secretaria dos Direitos
Humanos optou pelo silêncio. A Casa Civil idem. Enquanto isso, louva-se a ditadura em sala de aula.
Na Presidência, Lula se revelou
vacilante quanto à questão militar.
Deixará ao sucessor, por exemplo,
o exame de violações de direitos
humanos no período da repressão.
Para uns, foi amadurecimento político. Para outros, acovardamento.
Uma coisa, porém, é manter intocados os arquivos da ditadura. Outra é permitir que eles continuem a
fabricar mentiras -e para jovens.
Um efeito da hesitação de Lula e
seus ministros é que ela transfere à
candidata do PT a pressão por um
"posicionamento" -e não só devido ao passado dela na luta armada.
Como ministra, Dilma Rousseff
não destoou do morde-e-assopra
de Lula. Mas nunca pareceu confortável com essa abordagem no que
diz respeito aos "anos de chumbo".
Numa premiação na Confederação Nacional da Indústria, em
2008, Dilma foi uma das poucas
pessoas que não aplaudiram Jarbas
Passarinho. O ex-ministro em três
mandatos do regime militar acabara de discursar, e a ministra, de braços imóveis, procurava com os
olhos na plateia um cúmplice para
a "desobediência civil".
melchiades.filho@grupofolha.com.br
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