|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NELSON MOTTA
Coxas jurídicas
RIO DE JANEIRO - Há alguns
anos, quando morava em Nova
York, encontrei num restaurante
da Madison Avenue uma advogada
brasileira comandando uma grande
mesa, cercada por senhores comendo, bebendo e falando alto. Pelos
ternos, as gravatas e o volume da
voz, eram, sem dúvida, brazucas.
Talvez fossem clientes dela e, pelas
caras, certamente envolvidos em
falcatruas e negociatas. Ou pior, talvez fossem parlamentares.
Parei para cumprimentá-la e ela
me apresentou seus convidados.
Eram juízes brasileiros que estavam em Nova York para um seminário sobre legislação americana.
Americana? Yes.
Em pé, junto à mesa, vi que o magistrado ao lado da advogada, sotaque nordestino carregado, bigodão
e exalando testosterona, deslizava
uma mão boba sobre a coxa da causídica. A saia, que já era curta, ficou
justa, mas a moça agüentou firme, o
magistrado apertou. Constrangido,
fui embora me sentindo meio envergonhado pelo testemunho.
No dia seguinte, ela me contou
que era um bando de juízes brasileiros que estava em Nova York por
conta de dois poderosos escritórios
de advocacia americanos, com muitos clientes e interesses no Brasil.
As poucas palestras seriam feitas
por advogados brasileiros, em português, apenas como pretexto para
uma boca-livre de uma semana em
um cinco estrelas de Manhattan.
Nada ilegal, apenas indecente.
A advogada, uma bela morena
paulistana, formada e radicada em
Nova York, fora escalada para palestrar e ciceronear a turma. E contou, às gargalhadas, que o maior trabalho foi convencer alguns meritíssimos que bolinação e beijo na boca
não estavam no pacote.
Seria só patético e cômico, mas é
trágico, porque são esses homens
que nos julgam e decidem o que está certo ou errado.
Quem julga esses juízes?
Texto Anterior: Brasília - Eliane Cantanhêde: Parece, mas não é Próximo Texto: José Sarney: A prudência e o lazer Índice
|