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TENDÊNCIAS/DEBATES
Lula e as escolas técnicas
PAULO RENATO SOUZA
No seu programa eleitoral, Lula tem afirmado que o governo FHC teria proibido a expansão do ensino técnico no país. É pura mistificação
NOS SEUS programas eleitorais
sobre educação, assim como
em encontros com lideranças
empresariais, o presidente Lula tem
afirmado que o governo Fernando
Henrique Cardoso teria proibido por
lei a expansão do ensino técnico em
nosso país. É pura mistificação.
A lei nš 9.649, à qual se refere o presidente, tratava da expansão da educação profissional, indicando que novas escolas técnicas deveriam ser
criadas pela União, sempre em parceria com os Estados, com o setor produtivo ou com entidades não governamentais. Neste segmento comunitário, incluíam-se ONGs, fundações e
sindicatos patronais e de trabalhadores que passaram a criar novas escolas técnicas com o apoio financeiro do
governo federal.
Foram duas as nossas motivações
para promover essas parcerias em vez
de simplesmente criar novas escolas
técnicas federais.
Primeiro, era preciso garantir uma
vinculação maior e mais ágil entre as
escolas técnicas e as necessidades
sempre dinâmicas do mercado de trabalho local, onde os empregos são efetivamente gerados. Dificilmente essas condições são preenchidas por
instituições vinculadas burocraticamente a Brasília.
Depois, era evidente que, em geral,
nossas escolas técnicas federais ofereciam um bom curso de nível médio
que preparava os filhos da classe média para ingressar na universidade,
mas não atendiam às necessidades de
formar técnicos de nível médio para o
mercado de trabalho.
A LDB (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional) já havia definido
em 1996 a educação profissional como um segmento complementar ao
ensino básico. Com isso, nosso país
deu um passo gigantesco no sentido
de criar oportunidades para a obtenção de um diploma de técnico por jovens e adultos que concluíram o ensino médio regular nas escolas públicas
ou pela via dos exames supletivos.
Em outras palavras, o ensino técnico passou a atender a quem realmente tinha interesse em obter uma qualificação para o mercado de trabalho
-em geral, pessoas oriundas dos segmentos de menor renda.
Para apoiar a expansão da educação
profissional, buscamos financiamento internacional com um projeto de
US$ 500 milhões apoiado pelo BID
(Banco Interamericano de Desenvolvimento). Além de criar novas escolas
técnicas estaduais e comunitárias, o
Proep (Programa de Expansão da
Educação Profissional) canalizava investimentos para modernizar as escolas técnicas federais existentes com
equipamentos e laboratórios.
Entre 1998 e 2002, aprovamos 336
projetos, dos quais 136 para o segmento estadual, 135 para o comunitário e 65 para as escolas técnicas federais. Desse total, 104 foram concluídos e entregues até dezembro de
2002. Para os 232 projetos restantes,
sobravam mais de US$ 150 milhões
de recursos do BID e mais a correspondente contrapartida de recursos
nacionais a serem utilizados nos anos
seguintes. Esses recursos eram suficientes para a conclusão desses projetos e a aprovação de muitos outros.
Inexplicavelmente, o Proep foi
bruscamente interrompido a partir
de janeiro de 2003. Obras ficaram
inacabadas e muitos projetos nem sequer começaram. Em 2004, o governo devolveu ao BID US$ 94 milhões
não utilizados. Algumas poucas escolas técnicas foram concluídas graças
ao aporte de recursos da iniciativa
privada.
Essa situação perdurou até o segundo trimestre deste ano. Foi quando ficou claro aos marqueteiros de
Lula que, na campanha eleitoral que
se avizinhava, seria difícil sustentar a
prioridade para a educação com essa
marca tão negativa no ensino técnico.
Assim, tomaram-se 32 projetos daqueles 232 interrompidos que estavam mais avançados e se promoveu a
sua federalização, criando novas escolas federais ou novas unidades nas
existentes. Isso foi tudo o que o governo Lula fez pelo ensino técnico em
seus quatro anos de gestão.
Uma conhecida forma de enganar a
opinião pública -muito apreciada
por regimes autoritários- consiste
em repetir uma mentira constantemente. No futebol, para usar uma metáfora ao gosto do presidente, se diz
que a melhor defesa é o ataque. Esses
parecem ser os dois pilares de sua estratégia de comunicação nessa campanha eleitoral, como o episódio da
propaganda de seus "feitos" no ensino técnico demonstra claramente.
PAULO RENATO SOUZA, economista, foi ministro da
Educação no governo Fernando Henrique Cardoso, gerente de operações do BID, reitor da Unicamp e secretário de
Educação de São Paulo no governo Montoro.
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