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JOSÉ SARNEY
Guerra religiosa
Na história da humanidade,
o tema religioso foi inicialmente dominante. Petrônio
diz que Deus assim quis porque fez o medo antes de revelar-se. "Primus in orbe deos fecit timor" (Primeiro no mundo
Deus criou o medo). Os povos
primitivos precisavam explicar o mundo, e a explicação os
levava ao caminho da religião.
Na disputa pelo poder, o homem quis ser o guardião de
Deus e torná-lo uma arma em
suas guerras.
Logo surgiu a identificação
de Deus com reis, imperadores, faraós. Mesmo na civilizada Roma, Otávio, no caminho
para se tornar Augusto, usou o
cognome de Divi filius, deificando Júlio César e incorporando sua adoção.
Essa ideia passou na Europa medieval para a ideia da
monarquia por direito divino.
E continuaram as guerras religiosas, seja entre cristãos e
muçulmanos, seja, depois da
reforma, entre cristãos. Ainda
no Iluminismo havia títulos
como Sua Majestade Cristianíssima.
Depois, com a chegada da
democracia, parecia que o tema religioso tinha saído do
centro dos debates políticos.
Ainda havia movimentos integristas, como a Ação Francesa
de Maurras, no começo do século 20, mas eles não chegavam a dominar a cena.
Com Khomeini, o Estado
teocrático se instalou no Irã e
passou a ser um dado determinante da política internacional. Com Bush, a questão religiosa chegou à política dos
países democráticos, levantando as religiões conservadoras americanas como arma para atingir objetivos políticos.
Os neoconservadores defendem ideias primitivas, como o
Criacionismo, tese que rejeita
a evolução das espécies e considera Darwin um demônio.
No Brasil, a Igreja Católica
recuou em seu predomínio
tradicional, e os evangélicos
tornaram-se 30% da população. A igreja tentou uma primeira abordagem política com
a Teologia da Libertação, silenciada por João Paulo 2º.
Mais recentemente, os temas
doutrinários abriram espaço
para manifestações mais sensíveis às igrejas populares, como a união entre pessoas de
mesmo sexo e o aborto. Sobre
este, a legislação já protege a
vida desde a concepção, vida
que nós cristãos consideramos a maior graça de Deus.
Mas esses temas parecem
transcender os estudos teológicos e inserem-se numa presença exacerbada da religião,
no mundo inteiro, nos temas
quotidianos da sociedade,
atingindo a política. Essas
questões, tratadas de maneira
dogmática, podem evoluir para o bem ou para o mal.
A lição do Oriente Médio e
da expansão dos regimes teocráticos é um retrocesso, mostrando o perigo do radicalismo religioso. Temos que ficar
alertas para que este ódio não
invada o debate político brasileiro, abrindo caminho ao
fanatismo.
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta
coluna.
jose-sarney@uol.com.br
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