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KENNETH MAXWELL
O rei e o coronel
O REI JUAN Carlos, da Espanha, já enfrentou coronéis
antes de seu agora famoso
entrevero com o coronel Hugo
Chávez durante a 17ª Cúpula Ibero-Americana, no Chile, uma semana atrás. Em 23 de fevereiro de
1981, o coronel Antonio Tejero, da
Guardia Civil, a força paramilitar
espanhola, invadiu o Parlamento
com seus comandados. Diante de
um governo tornado refém e de
unidades militares de lealdade duvidosa, Juan Carlos agiu para alinhar as Forças Armadas com a causa da democracia e impediu o golpe. Foi um momento decisivo na
transição democrática espanhola,
e consolidou o prestígio da nova
monarquia.
O rei agora está mais velho (com
quase 70 anos), e parece que se tornou consideravelmente menos paciente. Desta vez, diante da diatribe do coronel Chávez contra José
María Aznar, ex-chefe do governo
espanhol, o usualmente fleumático
monarca perdeu a calma. Disse
zangadamente a Chávez algo que
muita gente deve ter sentido vontade de dizer ao longo dos anos:
"Porque no te callas?".
Pode não ser a mais monárquica
das expressões, decerto, mas veio a
calhar, e valeu muitos aplausos a
Juan Carlos em seu país. Mas o
rompante do rei propiciou ao coronel Chávez um precioso momento
"bolivarista": o rebelde venezuelano montado em seu (metafórico)
corcel enquanto o rei da Espanha
lhe apontava o dedo -uma excelente cena de teatro, 200 anos depois da luta dos venezuelanos por
independência do domínio espanhol. Mas, com certeza, não era essa a imagem que os inventores das
conferências de cúpula ibero-americanas tinham em mente para a
era doce e esclarecida do pós-colonialismo.
A única coisa surpreendente
quanto a isso tudo é que ninguém
tenha perdido a paciência antes
durante esses tediosos eventos. As
conferências de cúpula se tornaram um completo desperdício de
tempo e dinheiro, por falta total de
propósito ou conteúdo reais. E só
servem para provocar problemas
nas ruas e oferecer uma plataforma
perfeita a populistas demagógicos
como Chávez. Um fórum público
movido por palavras, e não por
atos, tende inevitavelmente a agravar disputas em lugar de resolvê-las. Ao menos os conclaves ibero-americanos não exigem, ao contrário das conferências da Associação
das Nações do Sudeste Asiático
(Asean), que os participantes vistam, ao final, camisas coloridas ou
trajes "tradicionais" para a cerimônia e foto de encerramento. Mas isso oferece pouco consolo.
Chegou a hora de deixar de lado
o aparato das conferências de cúpula para dar a todos nós, e especialmente ao rei Juan Carlos, um
repouso mais que merecido.
KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras
nesta coluna.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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