São Paulo, terça-feira, 15 de dezembro de 2009

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MARCOS NOBRE

Suprema incoerência

PELO MENOS três ministros do STF estão a dever esclarecimentos detalhados de seu posicionamento no recente julgamento que manteve a censura ao jornal "O Estado de S. Paulo". São eles Cezar Peluso, Eros Grau e Ricardo Lewandowski.
Em abril deste ano, posicionaram-se com a maioria no julgamento que revogou integralmente a Lei de Imprensa. E agora votaram pela manutenção da censura ao jornal, que continua proibido de publicar informações sobre uma operação da Polícia Federal que tem como alvo principal Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney.
O problema é que as duas coisas são incompatíveis. A decisão de revogar a Lei de Imprensa revela uma posição liberal clássica dos magistrados: não haveria por que limitar a liberdade de informar por legislação específica. Já a decisão de manter a censura a "O Estado de S. Paulo" mostra um intervencionismo jurisdicional direto para limitar essa mesma liberdade.
Sem uma lei específica, a liberdade de informar passou a ser regida pela legislação constitucional, civil e penal existente. Só que, no caso da censura ao jornal, isso significou que a liberdade de informar foi subordinada ao direito à privacidade.
Se esse caso se tornar paradigmático, a liberdade de informar poderá vir a ser subordinada a qualquer outro direito constitucional fundamental. E o STF legará à posteridade a infame construção dogmática da "censura preventiva".
As liberdades de expressão são liberdades peculiares. Porque, como todo direito, deveriam em princípio ter seu exercício limitado por parâmetros legais prévios. O problema é que limitá-las previamente significa, na prática, negá-las.
Não é nada tranquilizador saber que a reputação de qualquer pessoa pode ser injustamente atingida pelo exercício da liberdade de informar. Mas até hoje não se encontrou outra maneira democrática de preservar esse direito que não a do controle judicial posterior ao fato, da indenização de quem tiver sido injustamente prejudicado, da reparação de danos causados.
Exigir coerência dos magistrados da corte constitucional em um caso grave como esse é o mínimo. O que não significa que tenham feito bem os restantes três juízes que votaram a favor da censura -Gilmar Mendes, Ellen Gracie e José Antonio Dias Toffoli (que ainda não era ministro quando da revogação da Lei de Imprensa). Significa apenas que foram coerentes em seus posicionamentos. Mas, quando o que está em causa são as liberdades de expressão, exigir coerência é ainda muito pouco.

nobre.a2@uol.com.br


MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.


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