São Paulo, sábado, 16 de fevereiro de 2008

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Os gastos da segurança presidencial com cartões corporativos devem ser mantidos sob sigilo?

SIM

Dilema: segurança x transparência

JORGE ARMANDO FELIX

" VIVEMOS NUM permanente embate entre a chamada transparência absoluta e a necessidade de preservar ao máximo a segurança das autoridades e das demais pessoas protegidas.
Do ponto de vista da segurança, do nosso trabalho, quanto menor a transparência, maior o grau de segurança. O que buscamos é achar um ponto de equilíbrio." Essas palavras, que usei numa entrevista coletiva e das quais a imprensa destacou apenas uma frase, usada recorrentemente por alguns veículos, mostram o dilema que nos traz a estas páginas: segurança x transparência.
Por lei, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI) deve zelar pela segurança pessoal do chefe de Estado, do vice-presidente e respectivos familiares, bem como pela segurança dos palácios presidenciais e das residências. Vale a pena ressaltar algumas peculiaridades dessa atribuição:
- Não há limites físicos, o que significa que onde quer que residam ou estejam as pessoas a serem protegidas, ali também têm que estar as pessoas que lhes dão proteção, seja em suas casas, em seus locais de trabalho, vivendo seu dia-a dia, seja em viagens de qualquer natureza, ou mesmo em locais de lazer como teatros, shows ou restaurantes. A pessoa vai a um teatro, os seguranças vão ao teatro. Vai à praia? Os seguranças também vão e com a obrigação de saber nadar.
- A segurança faz uma avaliação de riscos para cada situação e alerta as pessoas sob sua proteção. Mas a decisão de fazer ou não fazer alguma coisa é exclusiva dos protegidos, cabendo à segurança executar seu trabalho da melhor forma possível.
Com que níveis de risco trabalhamos? Cada caso é um caso. As possíveis ameaças são múltiplas e muitas vezes pouco previsíveis. Quem matou John Lennon foi um fã ardoroso; quem atirou contra Reagan foi um apaixonado por uma atriz de cinema; Sérgio Vieira de Mello foi morto em uma missão humanitária; na vizinha Argentina, houve dois atentados que causaram o maior número de mortes da história israelense; Tim Lopes foi brutalmente assassinado quando fazia seu trabalho jornalístico; mais recentemente, um presidente da Ucrânia foi envenenado. Nossa própria história registra atentados como aqueles ocorridos contra d. Pedro 2º, em 1889, e contra Prudente de Moraes, em 1897. Seqüestros são constantes ameaças no mundo, como forma de intimidação, pressão política ou busca de resgate. Esses são apenas alguns exemplos. Quando o presidente do Brasil encontra-se ao lado do presidente dos EUA ou do rei da Espanha, seu grau de risco é o mesmo dessas outras personalidades.
Em que medida a informação ostensiva contida em pequenas despesas corriqueiras pode ameaçar a segurança? Vejamos:
- A proteção de coletes balísticos enviados a uma lavanderia mostra o tipo de colete e, em conseqüência, qual a munição necessária para perfurá-lo, assim como o tipo de carro blindado alugado ou adquirido numa licitação permite a mesma dedução;
- Quantidade de seguranças, rotinas de trabalho, posição do carro do presidente em um comboio são facilmente dedutíveis quando sabemos quantas refeições são encomendadas, onde são realizados os treinamentos e a manutenção dos veículos, ou quais equipamentos de comunicação foram adquiridos.
Pelas razões citadas, julgamos que a maior parte dos gastos, mesmo aqueles aparentemente irrelevantes, deve sofrer uma criteriosa avaliação para decidir os que não serão considerados sigilosos. Ressalto que os gastos realizados pelos agentes da segurança são verificados pela chefia imediata, pelo Departamento de Segurança do GSI, pelo controle interno da Presidência e pelo TCU, ficando as prestações de contas de modo permanente à disposição dessas autoridades, o que por si só já caracteriza transparência.
Por último, destaco que o cargo de presidente da República não é de natureza comum. Trata-se de uma instituição, cujo ocupante provém de uma escolha realizada pela maioria absoluta dos eleitores brasileiros. Cabe à sociedade compreender a importância dessa instituição, valorizá-la e zelar por sua dignidade. E ao GSI, preservar sua liberdade de ação e garantir sua segurança.


JORGE ARMANDO FELIX, 69, é ministro de Estado chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência.

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