São Paulo, sábado, 16 de junho de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A Câmara dos Deputados deve aprovar o voto em lista fechada para eleições proporcionais?

NÃO

Uma piora na qualidade da representação

JOSÉ ANÍBAL

NESSES DIAS de início de votação da reforma política, ouvimos com freqüência que nosso sistema eleitoral proporcional, "pior do que está, não pode ficar". Pode! Basta adotarmos o sistema de lista fechada ou qualquer outro atalho -como lista flexível- com o propósito de restringir ainda mais a representatividade dos parlamentares.
Também foi freqüente ouvir nesses dias a respeito do desgaste dos parlamentares quanto à obtenção de recursos para financiamento das campanhas. Criou-se uma indevida relação entre aprovar as listas e ter o financiamento público de campanha.
Cabe perguntar, como diria Ulysses Guimarães: como Sua Excelência, o eleitor, foi tratado nesses dias em Brasília? Para dizer o mínimo, como pano de fundo, longe, muito longe de ser o personagem principal que representa correntes, tendências, esperanças e desejos que devem ser resgatados pelos parlamentares em sua função de representação.
O que está em pauta, no atual estágio do debate, é se o eleitor vai escolher entre uma multidão de candidatos, votando num e, muitas vezes, elegendo outro -inclusive de outro partido-, como é atualmente, ou se as direções partidárias oferecerão uma lista com os nomes dos candidatos preordenados para ser sufragada.
Os dois modelos não contemplam um aspecto vital do aprimoramento e da progressiva melhora da representação popular, ou seja, a possibilidade de o eleitor reconhecer o seu deputado e fiscalizá-lo, punindo-o ou premiando-o na eleição seguinte.
Reforçar a qualidade da representação e, dessa forma, fortalecer a própria democracia deve ser o ponto principal da reforma política, que é defendida por 11 entre dez parlamentares. Se assim é, o objetivo central será construir uma relação mais estreita entre a população e o eleito, e não escondê-lo numa lista.
A tramitação da reforma política começou com uma tentativa enviesada e totalmente equivocada, para dizer o mínimo, de estabelecer o voto em lista como condição para combater outros males de nosso remendado sistema eleitoral.
É óbvio que podemos votar a fidelidade partidária e o fim das coligações proporcionais imediatamente. E abrir um procedimento acordado entre todos os partidos para decidir sobre o novo modelo para constituição da representação popular. Inclusive -e inevitavelmente, se quisermos fazer uma verdadeira reforma- com mudança constitucional para tratar do voto distrital. Caso contrário, a reforma não vai andar, se restringindo a um jogo de conveniências que, no limite, pode comprometer nossa democracia e o Parlamento, que já está debilitado, perdendo vitalidade e a confiança da população.
Os males da nossa representação não se resolvem com lista fechada ou aberta. Corrupção, mensalão, desdém com o que pensa a sociedade, impunidade, corporativismo etc. têm várias origens, mas, sem dúvida, a principal é a escassa possibilidade de o eleitor fiscalizar o parlamentar. Para isso, é imprescindível o voto distrital, que não só aproxima o eleitor do eleito como propicia a fiscalização.
A lista fechada retira do eleitor a possibilidade de escolher seu candidato e, dessa forma, faz piorar ainda mais a qualidade da representação, afastando o eleitor do eleito.
É equivocado dizer que a aprovação da lista fechada facilitaria o caminho para o voto distrital. A única certeza do voto em lista fechada é que o poder das burocracias partidárias seria eternizado. Os debates dessa semana mostram que é possível avançar, na Câmara, para um sistema eleitoral que resgate a legislatura atual de seu precoce envelhecimento, prenunciador de crise que podemos evitar.
É necessário colocar a votação do voto distrital na ordem do dia da Câmara. O debate no Parlamento e na sociedade definirá se o sistema será puro ou misto. Não há outro caminho para construir a centralidade de Sua Excelência, o eleitor, como recomendado por Ulysses. Aliás, esse processo de reforma pode -e seria bom se assim fosse- engendrar ampla participação popular, como nas Diretas-Já. O Brasil precisa.


JOSÉ ANÍBAL PERES DE PONTES, 59, economista, é deputado federal pelo PSDB-SP. Foi líder do PSDB na Câmara (1995-97) e presidente nacional do partido (2001-03).

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