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SERGIO COSTA
Do Leme ao Pontal
RIO DE JANEIRO - Milícias? Estou fora. Um amigo querido foi torturado por tentar mostrar com suas
lentes como vive uma favela sob domínio paramilitar. Ousado, cascudo, ama atuar na linha de frente da
guerra pela informação. Foi parceiro de Tim Lopes, torturado e morto
há seis anos. Acompanhou as investigações do crime contra o repórter
que virou lenda. Rezou na cova rasa
de seu sacrifício. Por pouco não teve o mesmo destino.
É preciso cuidado para falar de
milícias. Na rua onde moro atua
uma. Solícitos seguranças com coletes onde se lê a inscrição
"APOIO". São remunerados por
uma vizinhança apavorada com
possíveis e iminentes ataques aos
seus patrimônios financiados.
Somos todos reféns. Eles, os seguranças, conhecem bem nossos
passos, embora a gente já nem os
veja mais na correria do dia-a-dia.
Sabem quando saímos embolados
aos filhos; nos assistem chegar do
trabalho ou de festas, indefesos ou
meio tontos. Cobram uns caraminguás para isso.
O Rio foi loteado do Leme ao
Pontal, para ficar só na orla cantada
como rota do paraíso por outro
grande Tim: o Maia. No Leme, zona
sul, o tráfico encurrala até quartel
militar. Dali ao Pontal, zona oeste,
os arredores das praias são rateados
entre a máfia do pó e o poder paramilitar. Segurança privada nas ruas,
poder bélico dos "comandos" nos
morros. Quilômetros de gente armada até o [nosso] pescoço.
Entre as duas forças, os contribuintes e a polícia paga por seus impostos -com uma banda podre dividida: naco vende miopia aguda ao
crime; parte, nas horas vagas, parcela proteção contra o medo em
forma de "APOIO" amarelo. O Rio
virou uma seqüência de cidadelas
medievais com donos, leis de exceção e taxas próprias. Não dá nem
para chamar o síndico. Tim Maia?
Tim Lopes? Estão mortos. Não há,
no mundo dito civilizado, nada
igual.
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