|
Próximo Texto | Índice
Além da CPMF
Depois da derrota do governo no Senado, o debate da reforma tributária pode avançar em bases mais sólidas
RUIM PARA a economia,
bom para as instituições
políticas? Seria demasiado simplista resumir assim o saldo da rejeição, pelo Senado Federal, da emenda que
prorrogava a CPMF. São muitas
as variáveis em jogo, e incertos,
ainda, os desdobramentos concretos da decisão.
Do ponto de vista econômico, o
fim do chamado imposto do cheque tende a produzir efeitos em
larga medida ilusórios sobre a vida do contribuinte. Não há como
supor que o governo possa compensar no curto prazo a perda de
R$ 40 bilhões por meio de uma
redução de gastos equivalente.
Ainda que se intensifiquem as
pressões para a diminuição da
máquina estatal, o que é positivo,
os ajustes emergenciais virão pelo caminho costumeiro. A saber,
novos aumentos de impostos,
com efeitos talvez mais perversos do que os ocasionados pela
própria CPMF.
Fortalece-se, entretanto, o peso institucional do Legislativo.
Quem acompanhou, pela TV Senado, os vivos e circunstanciados
debates da noite de quarta-feira
passada terá, sem dúvida, nuançado aquela permanente impressão de despreparo, parasitismo e desfaçatez que, com motivos de sobra, associa-se ao comportamento parlamentar.
Numa questão polêmica e relevante, o Executivo teve de confrontar-se com limites reais à sua
capacidade de dobrar as vontades do Congresso. O recurso a
apadrinhamentos e liberações
de verbas, de resto fartamente
utilizado, bem ou mal se revelou
insuficiente para resolver um
impasse que, nestes dias, atraiu
crescente vigilância do eleitor.
Um padrão alternativo de negociação, distante da fisiologia
de sempre, foi ao mesmo tempo
esboçado. Propuseram-se -é
certo que em meio a sinais patentes de inabilidade e arrogância por parte do Planalto- modificações substantivas na emenda, na tentativa de aprová-la. Um
diálogo às claras, ainda que truncado, disputou espaço com as
gestões menos confessáveis de
que usualmente se ocupam os
políticos nesse tipo de ocasião.
Talvez a partir daí se possa superar a cisão entre o que houve
de progresso institucional e de
leviandade econômica no desfecho do episódio. O fim da CPMF
surgiu como oportunidade "in
extremis" para a oposição demonstrar alguma força política,
bem como para adotar a bandeira da redução da carga tributária
como ponto fundamental de seu
discurso. Para além das trêfegas
conveniências de identidade
partidária de uns, e do paquidérmico apetite arrecadatório de
outros, o debate de todo modo
avançou.
Vitoriosos e vencidos agora
disputam que versão dos fatos
haverá de prevalecer na opinião
pública: se foi feita justiça ao
contribuinte ou se foi punido o
cidadão de baixa renda.
Colocado nesses termos, o dilema é apenas retórico. Uma real
reforma tributária pode ao mesmo tempo reduzir a carga fiscal e
corrigir sua iniqüidade do ponto
de vista distributivo. Encerrada a
refrega da CPMF, o país parece
emergir um pouco mais maduro
para essa discussão.
Próximo Texto: Editoriais: Margem para produzir
Índice
|