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CLÓVIS ROSSI
As culpas no Haiti
SÃO PAULO - É possível, mas não é certo, que o jeitinho dado para atribuir a Rene Préval a vitória no primeiro turno da eleição haitiana impeça que a missão brasileira no Caribe acabe registrada como um fracasso do governo Lula. Fracasso até pode ser, mas tem muitos pais.
Primeiro, é preciso ter claro que é
falso atribuir o caos haitiano ao golpe
que depôs o presidente Jean-Bertrand
Aristide, patrocinado pela ultradireita norte-americana, segundo o "New
York Times".
Caos havia antes da primeira gestão Aristide, continuou com ele, na
primeira vez, e também na sua volta
ao poder, patrocinada pelos Estados
Unidos (sim, os Estados Unidos).
Aristide já havia se convertido em
mais um dos políticos envolvidos na
guerra de gangues que caracteriza o
país em função da desagregação do
Estado.
O pai da desagregação chama-se
François Duvalier (1957-71), o sanguinário ditador que os Estados Unidos apoiaram no marco da velha (e
boa?) Guerra Fria.
Imaginar que a desagregação poderia ser revertida pela simples presença de um pequeno grupo de soldados
é acreditar em Papai Noel.
Se os EUA, muito mais poderosos
economicamente e com Forças Armadas infinitamente mais equipadas, fracassaram na Somália, por
exemplo, por que supor que o Brasil
teria êxito no Haiti? O máximo que
poderia conseguir -e conseguiu-
foi reduzir a sangreira.
Esse tipo de situação-limite demanda uma presença internacional maciça, em recursos humanos e materiais, e um bom tempo para devolver
ao Estado as condições de funcionamento há muito perdidas. Mas a
atenção da comunidade internacional só se volta para os Haiti e os Darfur da vida se e quando as câmeras
de televisão mostram cenas dramáticas que, de tanto se repetirem, aqui e
ali, começam a perder até a dramaticidade. E a atenção se desvia tão logo
o "cameraman" desliga seu aparelho.
@ - crossi@uol.com.br
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