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RUY CASTRO
A Copa dos goles
RIO DE JANEIRO - Um tradicional festival de jazz -música que só
interessa a adultos, e, mesmo assim, a uma fração deles- deixou de
existir no Brasil há alguns anos porque não podia ser patrocinado por
uma marca de cigarros. Já a seleção
brasileira, que estará onipresente
nos lares brasileiros dentro de três
semanas, pode ser patrocinada por
uma bebida alcoólica.
A dita bebida, uma cerveja, tomará o país em dimensões nunca vistas e por todas as mídias existentes,
incluindo publicidade estática, indução subliminar e telepatia. Uma
rima pobre -"brahmeiro", "guerreiro"-, pespegada aos jogadores,
será o mote de milhões de crianças
enquanto durar a Copa do Mundo,
enfatizando, inclusive para os pais,
a "naturalidade" do consumo de
cerveja desde tenra idade.
Quinze por cento desses milhões
desenvolverão alcoolismo dentro
de dez anos. E, embora estejamos
falando de futebol, isso não é um
chute. É apenas a porcentagem de
pessoas que desenvolvem a doença
num universo humano com acesso
livre a bebidas alcoólicas, o que sói
ser o caso do Brasil. Não por acaso,
esse é também o número estimado
de alcoólatras no país: 28,5 milhões
-15 % da população.
A ideia de que a cerveja não é uma
bebida alcoólica -e, daí, apropriada
a patrocinar atletas- tem espantosa circulação entre nós. Não há força capaz de sequer enquadrar sua
publicidade em certos horários, como conseguiram com o cigarro (este banido de todos os veículos) e
com as outras bebidas.
O patriota Dunga -aliás, um dos
"brahmeiros" oficiais da campanha- não faz questão de que gostem dele, mas de que "gostem do
Brasil". Pois saiba Dunga que, seja
ou não o seu time campeão, o legado histórico da Copa de 2010 para o
nosso futuro será medido não em
gols, mas em goles. Muito apropriado para uma Copa dos copos.
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