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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Judiciário deve evitar o encarceramento de jovens?
NÃO
Internar é melhor do que reduzir maioridade
ROBERTO DELMANTO
No campo jurídico, há dois diplomas dos quais podemos nos orgulhar: a Constituição da República
de 1988, principalmente no que
concerne aos direitos individuais, e
o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que agora completa 20
anos. Ambos estão entre os mais
avançados da nossa época.
O ECA, contudo, vem sofrendo
críticas por parte de estudiosos e
idealistas, preocupados com o aumento, verificado nos últimos
anos, dos casos de internação, a
mais grave das medidas socioeducativas previstas.
Preconizam eles sua limitação a
determinados crimes, por meio de
uma reforma do ECA. Privativa da
liberdade, a internação não tem um
prazo mínimo, mas apenas o máximo de três anos, com reavaliação
obrigatória a cada seis meses e liberação compulsória aos 21 anos de
idade do menor.
Em São Paulo, na Fundação Casa, que sucedeu a Febem, de triste
memória, nas Unidades de Internação (UI) os internos recebem aulas
de 1º e 2º graus, ou mesmo alfabetização, ministradas por professores
estaduais; praticam atividades físicas, têm atendimento médico, psicológico e assistência social; podem ser visitados semanalmente
pelos familiares.
É verdade que a liberdade é e será sempre um bem maior. Mas os
juízes das varas da infância e da juventude só determinam a internação quando inexiste outra alternativa, seja pela gravidade do ato infracional, seja pela reincidência ou
habitualidade, ou mesmo pela total
ausência de estrutura familiar.
E, se as internações aumentaram, é porque a delinquência juvenil, e o "uso" dos menores pelos
marginais maiores infelizmente
também cresceram...
Na contramão do movimento
que visa limitar, legalmente, os casos de internação, retirando do juiz
a necessária discricionariedade para avaliar cada caso, sempre visando o bem do menor, há aqueles que
defendem a redução da maioridade
penal, dos atuais 18 anos para 16.
Entretanto, a maioridade penal
aos 18 anos não foi escolhida aleatoriamente por nosso legislador e
pela maioria dos países civilizados.
Ela resultou de estudos médicos,
psicológicos e sociais que mostram
que, antes dessa idade, carecem os
jovens da necessária maturidade.
Essa conclusão, a meu ver, continua válida, não obstante a mudança dos costumes, a comunicação
global, o ingresso precoce na vida
adulta e a proliferação das drogas,
batalha até hoje perdida em todo o
mundo, urgindo mudar a atual estratégia repressora...
Entre esses dois interesses relevantes que se chocam -de um lado, a necessidade social de segurança e, do outro, a proteção dos
menores -, acho preferível que, em
casos excepcionais, em face da alta
gravidade do ato infracional, da
não recuperação do menor, da sua
comprovada periculosidade e da
absoluta falta de amparo e/ou estrutura familiar, sempre por decisões fundamentadas e após ampla
defesa, a internação possa ser
maior do que os atuais três anos, indo, por exemplo, até cinco, ainda
que o interno venha a completar 21.
Ao mesmo tempo, é preciso penalizar mais duramente os maiores
que "usam" menores para perpetrar crimes. Diante desse panorama, estou convicto, após mais de
quatro décadas de advocacia criminal, que a internação é um mal menor do que a redução da maioridade penal.
ROBERTO DELMANTO é advogado criminalista e
coautor de "Código Penal Comentado" (8ª edição,
Saraiva, 2010), entre outras obras. Foi membro do
Conselho de Política Criminal e Penitenciária do
Estado de São Paulo e do Ilanud (Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do
Delito e Tratamento do Delinquente).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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