São Paulo, sexta-feira, 17 de setembro de 2010

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JOSÉ SARNEY

Um livrão no Planalto

Há três dias, a Fundação Joaquim Nabuco lançou, no Palácio do Planalto, um livro que se destina a ser raro e fazer escola: dois volumes de entrevistas com os chefes de comunicação da Presidência da República, de JK a Lula.
É, no fundo, a primeira publicação sobre os segredos do poder presidencial, como se tomam decisões e os bastidores de como elas chegam ao público. Foi uma inovadora iniciativa do ex-porta-voz André Singer, com fotos de Orlando Brito. As entrevistas são excelentes e revelam a tensão permanente entre o governo e os comunicadores, jornalistas em síntese. O Brasil não tem o hábito de fazer história com fontes primárias. Em geral, são degraus se repetindo uns aos outros. Autobiografias de presidentes, nem pensar.
Campos Sales escreveu um livro medíocre que é mais o relato da campanha republicana paulista. O diário de Getúlio é uma sequência de fofocas diárias sem nenhuma visão prospectiva, sem as fontes nem as razões de decisão. O de Juscelino, escrito a quatro mãos, tem altos e baixos. O primeiro volume, sobre sua infância e vida, é primoroso. Os demais são relatos bem escritos, porém mais relativos a Brasília que a ele mesmo. Epitácio Pessoa guardou seu ressentimento na geladeira, como dizia Tancredo, e colocou-o para fora nos livros de defesa irada do seu governo.
Nos EUA, a literatura de como se tomam as decisões na Casa Branca (título de livro de Theodore Sorensen) é farta. Há uns 25 anos, Michael Nielson, professor da Vanderbilt University e jornalista do "Washington Post", publicou um trabalho de profundidade sobre o assunto: "A Presidência e o Sistema Político".
Valeu-se de muitas informações de porta-vozes. Chegou a algumas conclusões: os presidentes que perseguiram e desejaram o poder saíam mais fortes do que entravam (veja-se Lula, cá, Roosevelt e Wilson, lá). A inflação dá a base de popularidade dos presidentes. Quanto mais baixa, mais popular.
Arthur Schlesinger Jr., a exemplo de seu pai em 1948 e 1962, classificou, em 1996, depois de ouvidos 719 historiadores, acadêmicos e cientistas políticos, o desempenho dos presidentes dos EUA -bons, regulares e ruins. Os bons quase sempre eram displicentes quanto à burocracia, se engajavam na liderança e exerciam o poder com energia e desenvoltura. "Idealismo" e "flexibilidade", avaliados previamente pelo sociólogo Gary Maranell, já não eram importantes para o julgamento final do governo. No fundo, o que pesa mesmo é o que ficou para a história. O circunstancial não conta.
Quem sabe, depois deste livro, cada porta-voz ficará tentado a escrever suas memórias da Presidência. Será bom para o Brasil e sua história, baseada em fonte direta.


JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.

jose-sarney@uol.com.br


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