São Paulo, domingo, 17 de outubro de 2004

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ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES

Juros extorsivos. Economia ladeira abaixo

Em artigo recente nesta coluna ("Viva a especulação", 19/9), mostrei-me indignado com os cumprimentos que as autoridades monetárias receberam das agências internacionais de classificação de risco por ter o Banco Central do Brasil elevado a taxa de juros em 0,25 ponto percentual. Indaguei por que o nosso país continuava recebendo tão poucos investimentos diretos para gerar empregos se tudo estaria correndo às mil maravilhas.
Na época, ninguém se dispôs a responder. A resposta veio na semana passada. Os jornais noticiaram que uma consultoria de Londres (A. T. Kearney), analisando os dados da nossa economia, resolveu rebaixar a posição do Brasil da 9ª para a 17ª em matéria de atratividade de investimentos diretos.
Está aí o troco. Os mesmos que aplaudem o bom comportamento nos pagamentos de juros colocam o Brasil entre as nações do mais alto risco para investimentos voltados para empregos e divisas. É uma grande ironia.
Na lista dos considerados bons países, a China é a preferida. Os Estados Unidos vêm em segundo lugar, e a Índia, em terceiro.
A boa classificação da China decorre da enormidade de seu mercado consumidor, de sua grande capacidade exportadora e das políticas governamentais de atração de capitais produtivos. Se considerarmos apenas os investimentos na indústria, a Índia salta para o segundo lugar, devido principalmente à sua capacidade de atrair empresas prestadoras de serviços de baixa, média e alta qualificação, aproveitando-se do bom nível de educação da população e dos baixos salários em nichos estratégicos.
Por que o Brasil caiu tanto? O que se alega é a incerteza quanto à política de regulação dos investimentos, em especial da infra-estrutura. A obscuridade das regras nos campos de saneamento, energia, estradas e telecomunicações seria a responsável pela forte elevação do risco Brasil.
Não se pode negar que isso pesa. Não se deve ignorar, porém, que os investidores nacionais continuam tocando suas atividades dentro dessas circunstâncias, confiando na enormidade do mercado consumidor brasileiro, nas infinitas potencialidades de energia limpa deste país e na capacidade produtiva dos brasileiros. Será que isso não toca os investidores estrangeiros?
Na luta pela regulamentação adequada, os investidores (nacionais ou estrangeiros) não se podem furtar a apresentar seus argumentos. Se há interesse em investir, é de responsabilidade de todos participar da modernização das instituições, utilizando para tanto os mecanismos do sistema democrático.
É muito cômodo para os especuladores saborearem as delícias dos juros altos e condenarem a esclerose de instituições antiquadas. Com o referido rebaixamento, ficou claro, mais uma vez, que o "esporte" de criar empregos para os brasileiros não é o forte de quem se viciou na jogatina. O Brasil precisa de capitais estrangeiros -e muito-, mas que venham para a produção, e não para a especulação!


Antônio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.


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