São Paulo, terça-feira, 17 de dezembro de 2002 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Rio Branco, as fronteiras e a defesa nacional
CARLOS DE MEIRA MATTOS
Manobrou rápido com os governos e empresas de Washington e Londres, para desfazer o maior obstáculo, o contrato do governo de La Paz com a Bolivian Syndicate, que concedia à empresa anglo-americana o direito de explorar a borracha e de administrar a área contestada. Fez com que o governo brasileiro enviasse uma força militar para ocupar a área de litígio (saiu da imobilidade e usou o argumento da dissuasão militar). Conseguiu às pressas que La Paz aceitasse um acordo preliminar de "modus vivendi". Obtida a trégua, negociou em ambiente de paz com os delegados bolivianos, conseguindo em novembro de 1903 a assinatura do Tratado de Petrópolis, solução definitiva para essa questão de fronteiras. Pelo tratado, o Brasil incorporou 191.000 km2 da área litigiosa e cedeu à Bolívia 2.296 km2. A solução da questão boliviana não foi aceita pelo Peru, que se julgava com o direito de parte do território negociado. Abriu-se nova disputa diplomática que Rio Branco resolveu a nosso favor. Durante sua gestão na pasta do Exterior, por dez anos, abrangendo os governos de Rodrigues Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da Fonseca, nossa diplomacia pôde ainda resolver, de forma definitiva, os litígios com a Colômbia, Inglaterra (Guiana) e Uruguai. Antes mesmo de vir a ocupar o cargo de chanceler, quando ainda na Europa, já o prestígio e gratidão nacional cobriam a personalidade de Rio Branco. Rui Barbosa, ao chegar ao Brasil a notícia de sua formidável vitória diplomática na questão do Amapá, escreveu no jornal "A Imprensa": "Hoje, literalmente, do Amazonas ao Prata, há um nome a irradiar por todo o círculo do horizonte num infinito de constelações; o filho do emancipador dos escravos, duplicando a glória paterna, com a de reintegrador do território nacional". A diplomacia de Rio Branco para as disputas de fronteiras, quando necessário, era dosada com habilidade negociadora e dissuasão militar. Ao assumir a pasta do Exterior, surpreendeu-se com a fraqueza de nossas Forças Armadas, sem condições de deslocar para as fronteiras com a Bolívia e Peru, ameaçadas pela ocupação militar, um efetivo equivalente ao de nossos litigantes. Por isso, porque precisava de um instrumento de força para compor o seu jogo diplomático, tornou-se amigo dos chefes militares da época -Argolo e Hermes, no Exército, e os almirantes Julio Noronha e Alexandrino, na Marinha- e deu apoio ao programa de reorganização, modernização e reequipamento do Exército e da Marinha. Não temos espaço, aqui, para historiar toda a grandeza diplomática de Rio Branco, que, pela sua competência negociadora e por seu patriotismo, incorporou ao Brasil cerca de 900 mil km2 de áreas litigiosas de nossas fronteiras. Carlos de Meira Mattos, 89, general reformado do Exército e veterano da Segunda Guerra Mundial, é doutor em ciência política e conselheiro da Escola Superior de Guerra. Texto Anterior: Tendências/Debates Gilberto Dupas: Uma missão estratégica para a Europa Próximo Texto: Painel do leitor Índice |
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