São Paulo, sábado, 18 de junho de 2011

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RUY CASTRO

Suspense no elevador

RIO DE JANEIRO - Alfred Hitchcock, cujos filmes estão sendo levados numa formidável retrospectiva no Rio e em São Paulo, nunca escondeu a receita de sua especialidade, o suspense. E era diabolicamente simples. Consistia em dar à plateia todas as informações sobre o que estava se passando na história -e esconder essas informações do protagonista.
Um exemplo é o do atentado contra a vida de um embaixador durante um concerto no Albert Hall, em Londres, no filme "O Homem Que Sabia Demais" (1956). O tiro será disparado no único momento em que o percussionista da orquestra tocar os címbalos. Bem, nós, na plateia, sabemos disso. James Stewart, o herói, sabe que haverá um tiro, mas não sabe quando. Hitchcock, com requinte sádico, faz a câmera deslizar pela pauta como se lendo a música, compasso por compasso.
Na vida real, Hitchcock também gostava de deixar as pessoas em suspense, num estado entre a expectativa e a angústia -neste caso, fornecendo-lhes uma informação incompleta, que elas não tinham como confirmar.
Fazia isso num elevador apinhado. Ao ver que o carro estava chegando ao seu andar, ele dizia casualmente a alguém ao seu lado, mas com voz clara e firme, para ser bem escutado: "Nunca imaginei que aquela velhinha do oitavo andar fosse ensanguentar o apartamento todo. Eles me prometeram que iam fazer um trabalho limpo". O elevador parava, a porta abria e ele saía, deixando para trás um grupo de pessoas perplexas, impotentes, angustiadas -em suspense.
Confesso que, inspirado por Hitchcock, também já andei fazendo isso em elevadores de hotéis. Mas sem tanto sangue na história -ao contrário. Dez segundos antes de a porta abrir, eu dizia para alguém: "Sabia que a Raquel Welch está incógnita no Brasil e hospedada neste hotel?". Saía -e deixava um rastro de suspense e esperança.


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