São Paulo, terça-feira, 18 de julho de 2006

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A porta de saída

Bolsa-Família tem caráter assistencial; apenas a expansão do mercado de trabalho pode emancipar os seus beneficiários

"A META é emancipar o maior número possível de famílias, mas temos de levar em conta que vivemos num mundo de desemprego estrutural." Assim o ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, reagiu ao fato de que o número de beneficiários do Bolsa-Família que se desligou do programa -atestando a possível conquista de uma fonte de renda autônoma- é desprezível.
Desde o início do projeto, em outubro de 2003, houve 2.099 casos (0,37% das pessoas diretamente atendidas) de devolução do cartão do benefício. Fatia significativa dos que desistiram não foi para o mercado de trabalho, apenas trocou um programa de assistência social por outro.
São precipitadas as críticas que atribuem ao programa federal de renda mínima um "efeito-esmola". De acordo com essa argumentação, a oferta de dinheiro regular pelo governo criaria no beneficiário uma dependência da ajuda pública, inibindo a busca de ocupações no mercado de trabalho. Por mais verossímil que, intuitivamente, a hipótese possa parecer, ela precisaria ser verificada na prática por pesquisadores ao longo dos anos. O Bolsa-Família, porém, é muito recente para permitir uma avaliação mais precisa nesse quesito.
Legítimos são, por seu turno, os reclamos -que quase sempre embasam os que criticam o Bolsa-Família pela linha do "efeito-esmola"- de que o desenvolvimento econômico do país, daqui para a frente, deve ser capaz não só de estancar o número de famílias que recorrem ao programa como de diminuir, paulatinamente, o seu público-alvo.
A observação serve para estabelecer os limites de uma política de assistência social como o Bolsa-Família. A meta de "emancipar o maior número possível de famílias", enunciada pelo ministro Patrus Ananias, extrapola as fronteiras de um programa de renda mínima. Está além dos limites até dos projetos mais modernos, que corretamente se preocupam, como é o caso em tela, em conectar beneficiários a iniciativas em saúde, educação e treinamento profissional.
O que decidirá a capacidade de emancipação dessa massa de mais de 30 milhões de pessoas será o nível de investimento -público e sobretudo privado- na ampliação dos postos de trabalho nos próximos anos.
Sem a criação maciça de novas vagas, para cada indivíduo bem treinado nos projetos ancilares do Bolsa-Família que deixar o programa porque conseguiu um emprego, haverá um outro, que acabou de ficar desempregado a alistar-se para receber dinheiro do Estado. O "desemprego estrutural" decerto existe, mas está muito aquém do nível atual -até porque grande parte da população ainda possui carências básicas, do século passado, como habitação e saneamento.
Por isso a agenda da política pública do próximo presidente, seja ele quem for, deve ser obsessiva na tarefa de reduzir os entraves que inibem os investimentos das empresas e do Estado. Baixar impostos, reduzir os juros e cortar despesas públicas correntes já ajudaria bastante.


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