São Paulo, sábado, 18 de agosto de 2007

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Vereadores, de novo

Câmara ameaça votar emenda constitucional que recria mais de 8.000 cargos extintos nos 5.560 municípios brasileiros

NÃO SE PODE acusar parlamentares brasileiros de falta de obstinação e coerência -quando em pauta estão cargos e verbas, entenda-se. Na Câmara dos Deputados, tal fixação materializou-se na proposta de emenda constitucional (PEC) nš 333/ 2004, que dispõe sobre limite de despesas e composição das Câmaras Municipais. Obviamente, trata-se de multiplicar postos de vereança no país.
O presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), anunciou que o projeto do deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) deve ser votado na semana que entra. Calcula-se que mais de 8.000 vagas de edis sejam criadas com as alterações na proporcionalidade. Um retrocesso quase completo da decisão de 2004 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que havia reduzido em cerca de 8.500 o total de vereadores nos 5.560 municípios. Hoje há pouco mais de 50 mil legisladores municipais no país.
A proporção entre habitantes de uma cidade e sua representação na Câmara -mínimo de 9 e máximo de 55 vereadores- está fixada no artigo 29, inciso IV, da Constituição. Como vários municípios davam interpretações maximalistas às faixas estabelecidas, inflando as bancadas legislativas, o TSE baixou resolução especificando 36 níveis. Muitas cidades viram suas Câmaras Municipais encolher, lançando os políticos em polvorosa.
Uma primeira tentativa de salvar os cargos ainda para a eleição de 2004 naufragou no Senado, em julho daquele ano. O Parlamento volta à carga, agora que se aproxima um novo ano eleitoral. Coerência e obstinação.
O único mérito da proposta, de todo eclipsado pelo despautério multiplicador, está na criação de 25 faixas (de 7 a 55 vereadores). Primeiro, por eliminar descontinuidade gritante na regra atual, que determina 21 vereadores até 1 milhão de habitantes e salta para 33 acima disso. Depois, porque prevê números ímpares de edis, para facilitar deliberações.
A racionalidade que a proposta pudesse agregar ao sistema se esboroa diante do indisfarçável propósito de voltar ao passado. Um sintoma da má-consciência parlamentar está na alegada preocupação do projeto de conter despesas municipais, reduzindo em meio ponto percentual os limites de repasse das prefeituras para as câmaras. Em face do contínuo aumento da carga tributária no país, essa aparente redução logo se diluiria.
Além do que, custa crer que os vereadores recém-empossados aceitassem reduzir proporcionalmente seus vencimentos. De resto, como reportou esta Folha em fevereiro de 2006, o corte anterior de cargos não parece ter levado a economia nenhuma, só a um remanejamento de verbas.
Se estivessem de fato empenhados em diminuir gastos, os parlamentares cuidariam de estender a todos os níveis de administração uma regra como a prevista no PAC e aparentemente já abandonada pelo próprio governo: fixar um limite, como o de 1,5%, para o crescimento das despesas reais com pessoal e encargos sociais. Mas isso já seria pedir coerência demais aos obstinados deputados e senadores.


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