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MARCOS NOBRE
Quiproquó
JOSÉ SARNEY ficou. E o recado
é: político agora só tem de prestar conta do que faz em época
de eleição. Não é mais apenas um
deputado do baixo clero que "se lixa" para a opinião pública, mas todo o sistema. Incluindo o Executivo, que banca Sarney, e o Judiciário, responsável pela censura
imposta ao jornal "O Estado de S.
Paulo".
O eleitorado que espere a sua
vez. Enquanto isso, pode se contentar com as duas explicações subentendidas que vêm com essa atitude. Primeiro, era necessário parar com a guerra de denúncias, porque, do contrário, iria acabar em
punições e muito pouca gente escaparia da degola. Além disso, não
há mesmo quadros muito melhores do que os atuais. Em suma, por
falta de opção, a grande maioria vai
acabar se reelegendo em 2010.
Quem viver verá. Mas o fato é
que, nessa batida, a política passou
a girar quase que exclusivamente
sobre seu próprio eixo. É um registro descolado da vida social, um registro infernal, em que tudo o que
se diz e tudo o que se faz serve apenas para outra coisa que não o que
se diz e o que se faz. É um mundo
de quiproquó.
O próximo círculo do quiproquó
é a CPI da Petrobras. A oposição
decidiu pôr o foco na estatal porque recebeu informações de conselheiros do Tribunal de Contas da
União (onde tem ampla maioria)
de que encontrar irregularidades
ali seria jogo jogado. Quer também
evitar que se repita em 2010 a tática de Lula na eleição de 2006,
quando Geraldo Alckmin foi acuado por supostamente querer privatizar a companhia.
E, por fim,
pretende provar que o PT colocou
a estatal a seu serviço, o que mostraria que o partido não respeita o
patrimônio público e é ineficiente
ao governar.
O PMDB, como sempre, é de
uma simplicidade brutal: instalou a
CPI para obrigar o PT a ficar com
Sarney. E, mantendo a coerência e
as vistas largas que o caracterizam,
está sempre à cata de novo material para chantagear o governo.
Já o governo fez coincidir a instalação da CPI com o anúncio da
decisão -tomada muito tempo antes- de criar uma estatal específica
para as jazidas da camada pré-sal.
E deu início a um debate nacional e
internacional sobre a exploração
das jazidas que consegue ser ainda
mais complexo e crucial do que todas as finadas reformas tributárias.
A ideia é engolir a CPI, arrastando
a discussão mais ampla enquanto
ela durar.
O debate mesmo não tem muita
importância. Afinal, não se pode
nem dizer que estejam jogando para a plateia. O que decidiram oferecer à plateia foi uma algaravia que
só faz sentido para quem está de fato se lixando para a plateia.
nobre.a2@uol.com.br
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras
nesta coluna.
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