|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Brasil deve ter legislação que regulamente a prática do lobby?
SIM
Lobby transparente e sob controle
JORGE HAGE
Há mais de dois anos, e sem relação com qualquer episódio recente,
a Controladoria-Geral da União
(CGU) iniciou amplo debate sobre a
necessidade de regulamentar uma
atividade que existe desde sempre,
imersa na semiclandestinidade: a
intermediação de interesses, ou
lobby.
Em 2008, a CGU promoveu, em
parceria com outras entidades, um
seminário internacional sobre o assunto, com a presença de especialistas de outros países, debatendo
regras e limites para a prática do
lobby, a partir dos modelos externos e de ideias contidas em projetos
que tramitam no Congresso Nacional, alguns há mais de 20 anos, como o de Marco Maciel.
As discussões envolveram o Conselho da Transparência da CGU,
com participação do Instituto
Ethos, da Abong (Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais) e da Comissão de Ética,
entre outros.
Disso resultou um projeto disciplinando o lobby em todos os Poderes. Esse projeto depende ainda de
análise e consenso em outras áreas
do governo.
Entendo que a pior maneira de
tratar o lobby é a atitude hipócrita
de fazer de conta que ele não existe,
o que acaba por deixá-lo nas sombras, confundindo-se com outras
atividades, bastante conhecidas,
que melhor atendem pelos nomes
de tráfico de influência, corrupção
ativa e advocacia administrativa.
Estas, cujo tratamento cabe apenas ao Código Penal, é que se beneficiam de tal confusão, travestindo-se sob o rótulo de lobby. Seus praticantes nada têm de lobistas; o que
são é criminosos.
É preciso mudar essa situação e
regulamentar a atividade do verdadeiro lobby, de modo que ela se desenvolva às claras e dentro de regras do conhecimento geral.
Se o lobby é a defesa de interesses (legítimos), ele faz parte do jogo
democrático, desde que se valha de
meios lícitos e obedeça a regras
iguais para todos. Em outras palavras, o que essa atividade precisa é,
como qualquer outra, de regras claras e transparência total.
Em linhas gerais, a proposta da
CGU parte do pressuposto de que a
atividade de intermediação de interesses faz parte da democracia e pode ser legítima, desde que exercida
nos termos da lei. Se não há lei, impera a confusão.
Afinal, o que ocorre quando entra em discussão, no Congresso ou
no STF, um tema de grande repercussão e que gera conflito entre interesses opostos? Lobby.
Isso é assim tanto nas questões
mais nobres, como a proposta popular da Lei da Ficha Limpa, como
em decisões envolvendo interesses
econômicos, como os de produtores de alimentos transgênicos ou os
de categorias que postulam vantagens remuneratórias.
Tudo isso é lobby.
Mas o representante de uma empresa que procura um agente público ou político para oferecer propina
em troca de uma decisão favorável
também se diz lobista.
Portanto, norma que estabeleça
clara distinção entre uma coisa e
outra e obrigue à transparência e ao
registro público dos lobistas assume extrema importância.
Essa norma, para ser eficaz, deve: definir o lobby e o lobista; exigir
a publicidade da sua atuação; prever o registro como condição de
exercício; e fixar normas de conduta, com sanções para as violações.
É um projeto com essa configuração que a CGU elaborou e que esperamos possa ser enviado em breve
ao Congresso, sempre na perspectiva de prosseguir ampliando a
transparência e consolidando a democracia brasileira.
Por óbvio, tal lei não é panaceia
contra a corrupção. Mas é mais um
passo nessa peleja, que irá somar-se a tantas outras iniciativas já lançadas pela CGU nos últimos anos.
JORGE HAGE, mestre em direito público pela UnB
(Universidade de Brasília) e em administração
pública pela Universidade da Califórnia (EUA), é
ministro-chefe da Controladoria Geral da União.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Texto Anterior: Cesar Maia: Dois votos ao Senado?
Próximo Texto: Rafael Cláudio Simões: Combater a corrupção exige mais que leis
Índice | Comunicar Erros
|