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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Serra em transe
SÃO PAULO - Não resisto a uma
provocação inicial: a blogosfera estaria em polvorosa e os serviços da
ombudsman da Folha amanheceriam entupidos de mensagens indignadas contra o jornal se a notícia não dissesse respeito a Monica
Serra, mas a Dilma Rousseff.
Isso dito, é claro que é polêmica a
publicação do relato de uma ex-aluna da mulher de Serra dando
conta de que ela (Monica), em sala
de aula, revelou já ter praticado um
aborto. Não se trata de uma notícia
qualquer. Ela coloca em conflito o
direito à informação, de um lado, e
o direito à privacidade, de outro.
Haverá, neste caso, bons argumentos a favor e contra a publicação. Penso que a Folha acertou, por
duas razões principais: com o aborto alçado a tópico da disputa eleitoral (e por obra de Serra), o episódio
passou a envolver evidente interesse público. E, tão importante quanto isso: Monica Serra havia dito, há
um mês, em campanha pelo marido no Rio, que Dilma era a favor de
"matar criancinhas", numa clara
alusão à posição da petista sobre o
aborto. Ao assumir como sua, e nos
termos que fez, a campanha do marido, Monica fixou para si as regras
do jogo que estaria disposta a jogar.
O caso (tão desconfortável, tão
cheio de implicações desagradáveis a quem o aborda) permite, ou
exige, uma reflexão de ordem mais
geral. O PT tem sido acusado, quase
sempre com razão, de ser capaz de
qualquer coisa para se manter no
poder. Isso virou um mantra, a despeito da sua veracidade. Mas Serra
não está se revelando, já faz tempo,
alguém disposto a pagar qualquer
preço para chegar ao poder?
Essa pantomima de devoção e
carolice que se apossou da campanha tucana (e que nada tem a ver,
como parece óbvio, com respeito
efetivo pela religiosidade do povo)
é a expressão patética de que tudo
(biografia, valores, familiares) está
sendo sacrificado em nome de uma
ideia fixa. Serra sonha ser presidente. Mas se parece, cada vez mais,
com o personagem de Paulo Autran
em "Terra em Transe".
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