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Risco de retrocesso
Eleições e saída de diretor geram especulação sobre futuro do BC, que deveria reforçar a autonomia informal já adquirida
NÃO FORAM raras as vezes em que se criticou,
com razão, o conservadorismo excessivo
do Banco Central. O trauma da
inflação elevada que contaminou
a economia brasileira por mais
de uma década não justifica o padrão de comportamento das autoridades monetárias do país,
que muitas vezes impuseram
custos desnecessários ao crescimento e à criação de empregos.
O exemplo mais recente de
exagero doutrinário no BC aconteceu no segundo semestre de
2008. Mesmo após o colapso do
banco de investimentos americano Lehman Brothers, em setembro, o Copom manteve a taxa
Selic estacionada em 13,75% por
três reuniões seguidas. Só iniciou o movimento de queda dos
juros em janeiro, quando o país
já entrava em forte retração.
A crítica, todavia, não se estende à conquista institucional inegável representada pela autonomia informal de que hoje goza o
BC. A demissão anteontem à noite do diretor de política monetária, Mario Torós, somada à proximidade do processo eleitoral
de 2010, estimula especulações
sobre o comportamento do BC,
quer no futuro imediato, quer
durante o próximo governo.
Torós conduziu desastradamente sua anunciada saída do
banco, de início prevista para dezembro. Ao tentar se apresentar,
em entrevista ao jornal "Valor",
como uma espécie de salvador da
pátria nos momentos mais graves da crise, divulgou informações confidenciais e lançou suspeitas sobre a atuação de outras
esferas do governo.
O episódio faz lembrar que a
desejada autonomia do Banco
Central não significa, apenas, erguer um anteparo de proteção
contra o voluntarismo da liderança política de turno. A cautela
deve valer, também, contra os interesses privados -seja de bancos, seja de outros setores empresariais- que tentam influenciar as decisões do BC.
A quarentena para diretores
demissionários, hoje de quatro
meses, deveria ser estendida. O
objetivo seria desestimular o intercâmbio meramente oportunista entre a função pública de
defender a moeda e posições privadas no mercado financeiro.
Adotar salários competitivos para os diretores -a fim de que o
BC atraia alguns dos melhores
quadros do país- também seria
uma medida a estudar.
Outro comportamento que deveria ser evitado é o presidente
do BC -ou um de seus diretores- lançar-se nas especulações
político-eleitorais, como ocorre
agora com Henrique Meirelles.
Atribui-se a José Serra (PSDB)
e a Dilma Rousseff (PT), neste
momento dois dos principais
postulantes ao Planalto, discordância semelhante a respeito de
como o BC tem se comportado
ao longo dos últimos anos. O risco, nos dois casos, é o de que um
diagnóstico equivocado -o de
que o conservadorismo excessivo decorre da autonomia concedida à instituição- leve a uma
resposta equivocada, que submeteria as decisões técnicas do
BC ao crivo político do Planalto.
Seria um retrocesso.
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