São Paulo, quarta, 18 de novembro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A LÓGICA DO MAIS FORTE

O presidente norte-americano, Bill Clinton, fez enérgico discurso, na semana passada, para dizer que os EUA não tolerarão a "inundação" de seu mercado por produtos baratos, particularmente o aço, no pressuposto de que a inundação ameaçaria empregos de norte-americanos.
Seu secretário de Comércio, William Daley, foi ainda mais longe no raciocínio. Ao comentar o saldo comercial do Japão com os demais países, excetuados os asiáticos, fez a seguinte observação: "É quase 3,5 vezes maior do que era há um ano. Trata-se de uma grande fonte de instabilidade, que pode levar à inquietação política, na medida em que as pessoas temam por seus empregos".
É lógico e até elogiável que autoridades de um dado país se inquietem com os problemas para os empregos internos eventualmente causados por um excesso de importações.
Mas um mínimo de coerência exige que os EUA não fechem os olhos para situações similares de que eles são beneficiários, em vez de vítimas.
No caso das relações comerciais entre o Brasil e os EUA, é possível fazer rigorosamente as mesmas contas que o secretário Daley fez sobre o saldo comercial japonês. Até 1994, o Brasil exportava mais do que importava dos EUA. A partir de então, o quadro se inverteu rápida e amplamente, a ponto de, no ano passado, ter havido um saldo de quase US$ 5 bilhões a favor dos EUA, quando, em 1990, o saldo favorável ao Brasil era superior a US$ 3 bilhões.
Seguindo até o fim a lógica de Daley, tais números podem ser tomados como "grande fonte de instabilidade" no Brasil e ameaça aos empregos de trabalhadores brasileiros.
Se os EUA desejam mesmo que a economia brasileira seja forte, como disse Bill Clinton, o caminho mais consistente é a redução das barreiras que impedem a entrada da produção brasileira no maior mercado do mundo. Seria a melhor maneira de evitar a sensação de que os EUA pregam uma coisa -a liberdade comercial-, mas praticam outra.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.