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MARCOS NOBRE
Bali e a usina de Gaddafi
CARNAVAL em Paris. Pelo menos para o coronel Muammar Gaddafi. O "guia da revolução líbia" fez da capital francesa seu parque de diversões por quase
uma semana.
Gaddafi montou uma tenda beduína ao lado do palácio presidencial. As principais pontes de Paris
eram interditadas à medida que
avançava seu passeio de barco pelo
Sena. Tumultuou o museu do Louvre para ver a "Monalisa" e a "Vênus de Milo". O mesmo no Palácio
de Versalhes, onde se deteve para
contemplar o trono de Luís 14, de
quem é admirador. Caçou na floresta de Rambouillet e pontificou
sobre o céu e a terra em diversas
oportunidades.
Nada mais justo. O presidente
Nicolas Sarkozy se achou muito esperto em fazer o primeiro movimento para "reabilitar" o "guia"
perante a "comunidade internacional", de olho nas reservas de petróleo e na venda de armas e usinas
nucleares. Gaddafi respondeu com
a maior balbúrdia diplomática e
política que a França experimentou nos últimos anos.
A idéia era aproveitar a coincidência da visita com a Conferência
das Partes sobre o Clima, em Bali.
Dada a importância dessa negociação global, e como a posição francesa é a mesma da União Européia a
esse respeito (metas rígidas de redução de emissões), a imprensa deveria tratar a visita de Gaddafi como evento menor.
Aconteceu o contrário. Mas algo
ainda mais importante ficou de fato na sombra: a nova ofensiva mundial (França à frente, Brasil logo
atrás) em favor da energia nuclear.
A França é o maior produtor de
energia nuclear da Europa. Setenta
e oito por cento da energia elétrica
do país vem dessa fonte.
O principal objetivo do presidente francês em matéria de política
externa é construir o que ele chama de "União Mediterrânea". É
uma idéia delirante, que, no fundo,
serve apenas para vender armas e
usinas nucleares para Marrocos,
Argélia, Líbia e quem mais se interessar. E para criar um contencioso
com a União Européia, especialmente com a Alemanha.
A energia nuclear é vendida agora como alternativa à crise dos
combustíveis fósseis e do efeito estufa. Em resposta ao declínio das
jazidas, diz-se que os novos reatores de nêutrons rápidos serão capazes de utilizar 100% do urânio
natural (ao contrário dos 0,6% do
isótopo U235, tecnologia usada
atualmente). Mas, para que se tornem comercial e politicamente
viáveis, é preciso espalhar usinas
por todo o planeta.
O primeiro-ministro François
Fillon deixou claro que "a França
não vende sua alma". Já usinas nucleares, sem problema. Só que é
uma péssima idéia fazer esse tipo
de negócio. Ainda mais quando o
cliente é Gaddafi.
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta
coluna.
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