São Paulo, sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

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Cortinas de fumaça

Proposta de plebiscito para uma Constituinte se presta a prover o discurso petista de respostas para o tema da corrupção

PRIMEIRO , um lance de marketing político rudimentar. Em seguida, uma proposta requentada e inviável. É desse modo que o presidente Lula e o PT cuidam de preparar, no desconfortável tema do combate à corrupção, o discurso da ministra Dilma Rousseff para a eleição de 2010.
Na semana passada, numa iniciativa puramente propagandística, o presidente enviou ao Congresso um projeto de lei tornando hediondos os crimes de corrupção ativa e passiva, peculato e concussão. Como já observado neste espaço, aumentar a severidade das punições em casos desse tipo não altera em nada o problema que de fato se necessita resolver: o de que haja rápida e concreta aplicação da lei.
Acrescenta-se agora, por iniciativa do PT, uma ideia já apresentada em 2007: a de que se realize um plebiscito sobre a convocação de uma Constituinte exclusiva, destinada a promover a reforma política.
No cronograma petista, a tese do plebiscito seria votada na mesma convenção partidária que consagrará -pois esta é a vontade de Lula- o nome de Dilma Rousseff como candidata à sucessão presidencial.
De um lado -com a tese do "crime hediondo"- cria-se uma bandeira de fácil entendimento popular. De outro, acena-se com um plano supostamente sólido destinado a empreender a reforma política, para consumo de uma plateia mais restrita.
O assunto retorna com frequência na retórica lulista, numa formulação inverídica: a de que o Planalto sempre quis promover mudanças no sistema, deparando-se entretanto com o desinteresse do Congresso.
O fato é que não houve real empenho, nem da parte do Executivo nem dos partidos que o apoiam, no sentido de tornar a reforma política algo além de uma desconversa, a ser repetida cada vez que se tornavam mais graves as denúncias de irregularidades no governo.
Com todas as ressalvas que o mecanismo inspira, a realização de plebiscitos pode sem dúvida estimular discussões reais na sociedade -foi o que aconteceu quando esteve em pauta a proibição ao comércio de armas.
Questões precisas e concretas -como, por exemplo, a do voto facultativo- poderiam, sem dúvida, ser submetidas à consulta popular. A da conveniência de uma Constituinte nada coloca de real na discussão política.
Na melhor das hipóteses, trata-se apenas de uma cortina de fumaça, a ser usada durante a campanha eleitoral; na pior, viria a fragilizar ainda mais a percepção de que a Carta de 1988, com todas as reformas de que necessita, deve continuar a ser respeitada como o documento fundamental da democracia brasileira.


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