São Paulo, sexta-feira, 19 de janeiro de 2007

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JOSÉ SARNEY

Um segredo energético

UMA VEZ, o comandante Maranhão, pioneiro na exploração do táxi aéreo, inventor e iluminado, procurou-me para dizer que descobrira um novo combustível que iria desbancar o petróleo. Queria registrar a patente, receoso de que fosse roubada. Procurei dele uma pista qualquer para entender o seu delírio. Ele pedia garantia total de sigilo, que eu não falasse a ninguém. Só entregaria os detalhes ao presidente da República. Seu invento iria revolucionar o mundo. Ele gozava do prestígio de ser o único piloto que sabia cair: três vezes, sem vítimas e em segurança! Voava os Cessnas 170, um monomotor de asa alta, de baixa velocidade, que consertava com arame. Num desses, na campanha presidencial de 1960, Jânio recusou-se a voar: "Sarney, você quer um candidato morto ou um presidente vivo?". Estranhei sua reação.
Fiquei agastado: "É esse o que temos, voa comigo e meus filhos". Ficamos amuados, até que ele me disse, com voz carinhosa: "Sarney, meu bem, isso se chama prudência. Prudência! Prudência! Prudência!"
A descoberta do comandante Maranhão morreu com ele. Depois circulou que sua matéria-prima era a lama que circundava os manguezais! Nunca quis confiar sua descoberta a ninguém, e nela ninguém acreditava.
Conto essa pequena história para dizer que estou desconfiado de que o Brasil tem um segredo bem guardado de alguma fonte de energia que ninguém sabe qual é.
Todo tempo vivemos a ameaça de apagão, que não podemos crescer mais de 3% por falta de energia, e isso não abala ninguém. Ao contrário, recrudescem os movimentos que recusam a construção de hidrelétricas. Elas criam danos irreparáveis à natureza. A energia nuclear também não aceitamos.
Angra 3 aí está, com um prejuízo monumental, a exigir, só para manutenção do material já comprado, milhões de dólares. Os gasodutos e os pedidos de pesquisa para nossos campos de petróleo não tramitam, como ocorre na bacia do Maranhão, porque abstratamente podem prejudicar o peixe-boi.
Contraditoriamente, o mais fácil no Brasil é conseguir licença para termoelétricas, a base de óleo combustível, estas sim, que, com os automóveis movidos a hidrocarbonetos, são as mais poluentes e responsáveis pelo efeito estufa, que amedronta o mundo com o aquecimento global.
Mas, já que não queremos energia hidráulica, nem nuclear, e estamos de acordo sobre a recusa de ampliar o consumo de combustíveis fósseis, o Brasil deve ter uma outra fonte secreta de energia, de uma origem que ninguém sabe.
A solução é ressuscitar o comandante Maranhão para trazer o seu segredo.


jose-sarney@uol.com.br

JOSÉ SARNEY
escreve às sextas-feiras nesta coluna.


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