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BORIS FAUSTO
O declínio dos caciques
Os caciques estão em franco declínio na cena política brasileira.
Estou chamando de caciques figuras
que se caracterizam pelo personalismo, com fortes traços autoritários,
exigindo fidelidade incondicional de
seus adeptos. No interior dos partidos,
tratam de convertê-los em máquinas a
seu serviço, seja pela dominação, seja
pelo exercício do "direito" de veto
diante de outras correntes.
Deixando de lado personagens menores, há um trio que representa esse
estilo, formado por Arraes, Brizola e
Antonio Carlos Magalhães. É evidente
que existem muitas diferenças entre
eles, convindo lembrar que os dois
primeiros são encarnações do nacional-populismo e o último uma encarnação de si mesmo. Entretanto todos
têm em comum o modo de fazer política, o que não constitui um traço secundário ou apenas geracional, mas
sim um dos aspectos relevantes de
nossa cultura política.
A figura de Arraes brilhou há muitos
anos, antes do regime militar, quando
foi um líder regional do nacionalismo
de esquerda. Na volta do exílio, chegou a eleger-se governador de Pernambuco, mas acabou se perdendo,
ao realizar uma administração deficiente, marcada também pelo caso
dos precatórios. Hoje Arraes é uma figura secundária no cenário político,
embora segure ainda as rédeas do
PSB.
A carreira de Brizola teve um espectro sabidamente maior. Ele alcançou
altos índices de popularidade no Rio
de Janeiro e no Rio Grande do Sul.
Não fosse o grau de sua rejeição em
São Paulo, disputaria a Presidência
com Collor, tendo possibilidades reais
de vitória. Mas, a partir daí, entrou em
um declínio melancólico, seja pela falta de sintonia com a realidade do Brasil e do mundo, seja pela atitude obstinada de impedir o crescimento de líderes à sua volta, como demonstram,
entre vários outros, os casos de Cesar
Maia e de Garotinho.
De forma até certo ponto surpreendente, ACM veio completar o declínio
do trio. Personagem do regime militar, o senador soube fazer a transição
para os novos tempos e se tornou uma
figura central da política brasileira,
ainda que seu poder e sua capacidade
de fazer política tenham sido mitificados pela mídia. Mas, na medida em
que sempre fez política destituída de
qualquer conteúdo programático,
acabou sendo vítima dos azares do
personalismo.
Tudo indica que ACM terá uma sobrevida, seja porque ainda representa
uma facção no interior do PFL, seja
porque tem todas as condições para
eleger-se governador da Bahia, onde
seu prestígio popular permanece inalterado, apesar de algumas estranhas
defecções partidárias. Mas isso é pouco para quem aspirou a muito mais e
promoveu a falsa imagem de sombra
todo-poderosa da Presidência.
O declínio dos caciques é, em si mesmo, um fato positivo. Entretanto, infelizmente, esse fato não nos leva ao otimismo, à constatação da gradativa
predominância de outro comportamento político, em que o desejo positivo de prestígio e de liderança se combine com a preocupação com os interesses coletivos. Pelo contrário, a recente guerra suja parlamentar não dá
margem a muitas esperanças.
Boris Fausto escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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