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MELCHIADES FILHO
Cone do silêncio
BRASÍLIA - Como as curvas de
concreto de Niemeyer ou os troncos retorcidos do cerrado, os cones
abóbora-e-branco fazem parte do
visual de Brasília. Toda semana o
departamento de trânsito alinha os
sinalizadores de plástico ao longo
da Esplanada dos Ministérios para
ordenar a passeata ou o comício.
O visitante deve achar que a cidade ferve, tantas as manifestações.
Mas os residentes não dão pelota.
Sabem que elas são como chuva de
peneira do Nordeste. Passam rapidinho e não têm conseqüência. Hoje em dia, elas parecem acontecer
só para justificar a existência de
quem as realiza. Ou para fazer girar
a grana que a "causa" arrecada.
Na quarta-feira, o MST tomou a
sede da Caixa. Um ministro celebrou a "construção" da cidadania.
Horas de megafone depois, o grupo
se foi. Nem papel picado deixou.
No dia seguinte, o comando dos
sem-terra estendeu a outros edifícios públicos a invasão-relâmpago.
Registrado o "abril vermelho" pelos
fotógrafos, a turma dispersou.
Alguns índios montaram e levantaram acampamento no gramado
bem em frente ao Congresso no início da semana. Foi tudo tão rápido
que não deu para anotar para quê.
Que pressão pode produzir um
ato municipalista que é patrocinado pela União? Não à toa, a marcha
de prefeitos acabou, anteontem,
contente em aplaudir um etéreo
"compromisso" do Planalto e do
Congresso com o pacto federativo.
Mesmo protestos vitoriosos, como o da UnB, não geram comoção.
Vibrar de que jeito, se a "transgressão" recebeu o apoio unânime das
autoridades? É sintomático que os
alunos tenham encerrado ontem a
ocupação da reitoria com uma faxina. "Faz de conta que não estivemos aqui", parecem querer dizer.
A inclusão das manifestações de
rua na rotina da capital da República é uma conquista democrática. Já
o roteiro protocolar e a atuação tutelada são indicadores da agonia
dos movimentos sociais.
mfilho@folhasp.com.br
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