São Paulo, segunda-feira, 19 de maio de 2008

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ALBA ZALUAR

Macro erros

Políticas macroeconômicas são, sem dúvida, mais universais e mais democráticas porque têm a capacidade de beneficiar toda a nação. No entanto, quando concebidas equivocadamente, com base em premissas falsas, erros de diagnóstico ou manipulação para esconder seu caráter exclusivista, provocam desastres incomensuráveis e de longa duração.
São sempre lembrados, para ilustrar os macro erros, os milhões de mortos na antiga União Soviética e na China, em conseqüência da coletivização forçada nos campos e uma tentativa de industrialização rural. Em vez dos 20 passos à frente, centenas para trás.
Mas não são apenas os regimes fechados que cometem tais façanhas. Aqui no Brasil, temos o desastre dos trilhos e dormentes esquecidos, inutilizados. Nos anos 1970 era moda ter dormentes como pés de mesa. E os poucos trens que nos restaram foram perdendo rapidez e encanto. Durante os 20 anos em que trabalhei na Unicamp, esperei ansiosa pelo trem-bala que nunca ligou Campinas às duas maiores cidades brasileiras.
Pior foi acompanhar o desmonte da promessa de mobilização e participação democrática contida nas organizações vicinais. Pior ainda, a transformação dos sindicatos de trabalhadores, cujos líderes de períodos mais heróicos eu tinha aprendido a admirar, para um estilo de pragmatismo e oportunismo que mudou completamente a imagem dos líderes. Claro que a cobrança do imposto (forçado) sindical só reforçou este estilo e permitiu o surgimento de chefes sindicais mais interessados na sua riqueza pessoal do que nos trabalhadores que comandam.
As promessas de sociedade organizada e participante, com eficácia coletiva para controlar e atenuar os conflitos violentos e destrutivos, formadas em gerações anteriores, são como os trilhos sociais, abandonados no meio do caminho, quando mais se precisava deles. E levam gerações para serem mais uma vez construídos e voltarem a proporcionar os fluxos da interação social necessária à cidadania. É mais rápido construir estradas de ferro.
Decisões para favorecer grupos específicos podem ser também fonte de grande perturbação institucional e perda de legitimidade. As políticas focais se justificam quando ajudar o grupo focado vai terminar por trazer melhorias a muitos outros, como acontece quando se amparam os idosos, as crianças, os jovens vulneráveis, as mulheres chefes de família pobres.
Mas o foco pode se tornar simplesmente privilégio para poucos quando não há justificativa para o apoio recebido. É o que parece estar ocorrendo na nova política econômica anunciada. Mais um desastre?


ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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