|
Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
O acordo
Entendimento com Irã não é garantia contra bomba, e o mesmo se pode dizer sobre sanções defendidas pelos EUA
É FATO QUE o acordo anunciado pelos governos de
Turquia, Brasil e Irã não
impede o país persa de
desenvolver um programa clandestino de enriquecimento de
urânio que o capacite um dia a
produzir um artefato nuclear.
É forçoso reconhecer ainda
que o agravamento de sanções
econômicas, como querem os
EUA e a Europa, tampouco é
uma garantia de que os iranianos
abandonarão a tentativa de ingressar no clube nuclear, formado por Índia, Paquistão, Israel,
China, Coreia do Norte, EUA,
Rússia, França e Reino Unido.
Novas punições aprovadas pelo Conselho de Segurança das
Nações Unidas talvez até mesmo
gerem o efeito contrário. Poderão auxiliar o regime iraniano a
seguir em sua estratégia de união
nacional contra pressões consideradas indevidas e injustas por
parte de países do Ocidente.
Essa tradicional linha política
reforça-se, no caso, com a assimétrica presença dos EUA na região, marcada por intervenções
militares unilaterais e apoio incondicional ao Estado de Israel.
A visita de Lula ao Irã, que esta
Folha viu com profundo ceticismo, considerando-a desaconselhável, não engendrou a solução
final para a crise -algo que nem
mesmo os otimistas acreditavam
possível. O entendimento também não se mostrou forte o bastante para bloquear a discussão
das sanções no âmbito do CS, o
que constituiria um objetivo
bem mais realista.
Mas essas considerações não
impedem que se avaliem como
positivas as gestões do presidente brasileiro e de seu colega turco. A atuação de Lula e Recep
Tayyip Erdogan merece elogios.
De maneira inédita conseguiram
obter do Irã a assinatura de um
compromisso diplomático -o
que muitos julgavam impossível.
Ao fazê-lo, os dois líderes demonstraram que a política internacional pode evoluir na direção
de processos decisórios menos
polarizados e menos concentrados nas potências tradicionais.
Está certo o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim,
ao chamar atenção para o fato de
ter-se logrado um acordo quase
idêntico ao que havia sido proposto, em outubro passado, pela
Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea) -o que em tese deveria ser suficiente para estancar a votação das sanções.
Mas ainda que tenha sido assim, o comportamento pregresso do regime iraniano minou sua
própria credibilidade. Os espetáculos racistas e belicosos patrocinados por Mahmoud Ahmadinejad, que negou o Holocausto e
propôs riscar Israel do mapa, não
foram esquecidos. E a sistemática recusa do país a se submeter à
ONU e a agir com transparência
em seu programa nuclear chegou a um ponto sem volta.
Nesse jogo que parece não ter
fim, tudo se passa como se as potências e o governo do Irã soubessem que a construção da
bomba é uma questão de tempo.
Difícil é precisar quando isso
acontecerá -e se, antes, o mundo não assistirá a novos conflitos
militares no Oriente Médio.
Próximo Texto: Editoriais: São Paulo saturada
Índice
|