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CARLOS HEITOR CONY
Como tirar um cavalo da chuva
RIO DE JANEIRO - Ingredientes:
um cavalo; uma chuva.
Modo de preparar: pega-se um
cavalo que esteja na chuva e, usando de persuasão ou de força, obriga-se o animal a se dirigir a um lugar
seco, onde deverá ficar até que a
chuva passe.
Modo de usar: são inúmeras as
vantagens de tirar um cavalo da
chuva, qualquer cavalo, da chuva,
de qualquer chuva. Chuva e cavalo
podem se misturar, mas há que tomar cuidado para não prejudicar a
natureza dos ingredientes, ficando
o cavalo molhado demais e a chuva,
que deveria fecundar o solo fazendo
nascer o trigo e as flores do campo,
ficar molhando inutilmente o cavalo, que não produz flores nem trigo.
Outro mérito de tirar o cavalo da
chuva, sobretudo para quem não
dispõe de um cavalo, mas está sujeito a chuvas e trovoadas, é fazer o
que deve ser feito, ou seja, tirar o cavalo da chuva e, se possível, tirar-se
a si mesmo da chuva.
Sabe-se que quem está na chuva é
para ser molhado. Recomenda-se
tirar o cavalo da chuva em ocasiões
especiais, como votações no Congresso, prorrogações de medidas
provisórias, reescalonamento de
dívidas públicas, cargos e funções.
É preferível tirar o cavalo da chuva, mantendo-o enxuto, do que enxugá-lo depois de molhado. Em caso de dúvida, para saber se o cavalo
está molhado ou não, aconselha-se
um relatório do senador Epitácio
Cafeteira.
Mas convém não exagerar e, a
pretexto de enxugar o cavalo molhado pela chuva, enxugar os orçamentos da saúde, da educação, dos
transportes, da segurança.
Como servir: com o cavalo tirado
da chuva, pode-se fazer muita coisa
ou nada fazer. Em ocasiões mais
críticas, o melhor é montá-lo e partir indignado em todas as direções.
(Esta crônica é dedicada a todos os
cavalos que estão na chuva).
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