São Paulo, sábado, 19 de agosto de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

O Brasil precisa adotar uma lei antiterror?

SIM

Pelo combate ao terrorismo

ANDRÉ LUÍS WOLOSZYN

OS RECENTES atos de violência ocorridos no Estado de São Paulo inauguraram uma nova fase na história criminal do Brasil, mesmo que muitos desses atentados tenham objetivo apenas midiático. Até o momento, não podemos precisar se todas as ações foram realmente praticadas pelo PCC ou se algumas partiram de outros grupos que aproveitaram o caos público e a sigla para cometer sua violência. O fato é que a utilização de explosivos, bombas incendiárias, eliminação de profissionais da área da segurança pública e o seqüestro do jornalista de uma emissora de TV com exigências para veiculação de mensagens, seja lá de que tipo, são ações semelhantes às ocorridas recentemente em países como a Colômbia e o Iraque -portanto, consideradas ações terroristas. Em uma análise comparativa com definições, tipos, características e categorias das ações estudadas em outros países, o chamado "modus operandi", poderemos verificar a semelhança entre o modo de agir deles, ou seja, a prática de ações sistemáticas de extrema violência para criar pânico e medo na população -e com uma evolução. Com o seqüestro do jornalista, a ação passou a ser indiscriminada e de ocasião. O fato de essas ações serem coordenadas por um grupo nacional aponta para o terrorismo nacional ou doméstico. Só não podemos legalmente classificá-las de "atos terroristas" em razão de não existir no país tipificação penal, ou seja, não há na legislação brasileira uma descrição da conduta punível e, portanto, nenhuma pessoa poderá ser enquadrada pela prática do crime de terrorismo. Caso ocorresse, seria considerado ato nulo, pois fere o preceito constitucional da reserva legal, de que "não há crime sem lei anterior que o defina", previsto no artigo 5º, inciso XXXIX. Apesar de a Constituição repudiar qualquer forma de terrorismo e de ser considerado crime inafiançável, sem direito a graça ou indulto, o terrorismo é tratado como crime comum, tipificado na Lei de Segurança Nacional ou na Lei de Crimes Hediondos. Em países desenvolvidos, a situação é diferente. Muitos possuem legislação própria relativa ao terrorismo. Um dos fatores que vêm acelerando esse processo são as previsões de especialistas de que haverá um recrudescimento das ações terroristas no mundo inteiro nos próximos dez anos, fruto da desigualdade social, falta de oportunidade de trabalho, descontentamento com regimes políticos e políticas, entre outros motivos. Por exemplo, o Código Penal francês define terrorismo como atos individuais e coletivos praticados com o intuito de perturbar a ordem pública por intimidação ou terror. Na Inglaterra, a Lei de Prevenção ao Terrorismo, de 1989, considera terrorismo o uso de qualquer tipo de violência com o propósito de impor medo no público ou em parcela dele. Nos EUA, é terrorismo a violência criminosa com o propósito de intimidar e coagir a população civil, influir em políticas do governo com intimidações e coerções e afetar a conduta do governo por meio de assassinatos e seqüestros. Seria ingenuidade acreditar que o Brasil está imune à ação terrorista internacional, já que o terrorismo de Estado se manifestou, embora de forma incipiente. A Lei Antiterror deve nascer de um profundo debate da sociedade brasileira, que está amedrontada e incapaz de reagir a essa nova realidade. Deve nascer a exemplo da Lei de Lavagem de Dinheiro, ou "Branqueamento de Capitais", que teve origem na resolução nº 1.373/01 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, contra o financiamento de ações terroristas, criminalizando-o, e tornando obrigatória para todos os Estados, sob pena de não poderem contrair empréstimos internacionais ou receber capital externo.


ANDRÉ LUÍS WOLOSZYN , 42, analista de inteligência estratégica pela Escola Superior de Guerra, especialista em terrorismo pelo Colégio Interamericano de Defesa (EUA) e em ciências penais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, é major da Polícia Militar do RS.


Texto Anterior: Frases

Próximo Texto: Denis Minze: Cumpra-se, e não se crie a lei

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.