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São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2003

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Foco nas despesas

HORACIO LAFER PIVA

Tema complexo esse em que a responsabilidade do governo no campo fiscal tranquiliza os credores e aterroriza os contribuintes.
O fato é que toda ameaça fiscal traz um risco de aumento adicional da carga tributária e, se não queremos um governo incapaz de reagir, também está mais do que provado que a sociedade não consegue arcar com mais impostos, taxas e contribuições nem sofrer com tamanha incerteza tributária. Está mais do que na hora de enfrentar o problema na raiz, atribuindo prioridade máxima à flexibilização e melhor gestão das despesas públicas. Mude-se, pois, urgentemente o foco da arrecadação para os gastos.
Esse esforço precisa ser apoiado de forma incondicional pela Presidência da República. Pode ser conduzido pela Fazenda diretamente, ou em parceria com o Planejamento. De toda forma, como os percalços e as medidas antipáticas não serão poucos, é fundamental o compromisso político de todos com tamanho desafio.
Atualmente é estreita a margem de manobra na administração das despesas correntes. Quando são necessários cortes, penalizam-se os investimentos, o poder de compra dos salários dos servidores públicos, os recursos para as agências reguladoras e tantos outros gastos indispensáveis para assegurar mínima eficiência ao setor público e estimular o crescimento do país. Tal situação é insustentável. A fórmula aplicada em 2003 não deve ser repetida nos próximos anos.
Há muito espaço para melhorar a gestão dos recursos administrados pelo governo. É preciso avaliar o benefício social de cada real gasto, reduzir a burocracia, estabelecer metas e dar transparência às aplicações. Também é desejável que se reduzam ou eliminem as excessivas vinculações das receitas.
A carreira do funcionário público merece ser urgentemente revalorizada. Se há a premência de conter as despesas com salários, que se criem condições para o fazer de forma compatível com esse objetivo de revalorização. Não é bom para o nosso país que se deixe de treinar o funcionário público nem tampouco que não se premiem aqueles com melhor desempenho. Da mesma forma, para a equação fechar, devem-se estabelecer critérios claros que possibilitem afastar aqueles que não cumpram as metas para eles estabelecidas.


Para nós, é claro o destino de uma empresa que reduz ano após ano o poder de compra dos seus funcionários


A experiência do governo do Estado de São Paulo nessa área de gestão das contas públicas é um exemplo importante. Aqui, em poucos anos, fez-se um profundo ajuste fiscal. A máquina de governo ganhou agilidade e eficiência. Ao mesmo tempo em que se economizaram milhões de reais, preservou-se a qualidade do serviço público e foi aberto espaço para mais investimentos.
Ninguém entende mais de gestão do que as empresas privadas. E, para nós, é claro o destino de uma empresa que reduz ano após ano o poder de compra dos seus funcionários, não os treina nem os motiva, não investe no seu próprio negócio e se torna cada vez menos eficiente. O Estado brasileiro não pode insistir nesse caminho.
Alguns apostam que o crescimento pode trazer toda a solução. Bastaria elevar as despesas públicas em percentual menor que a taxa de expansão de nossa economia. Concordamos que essa seria a alternativa menos penosa para ajustar os gastos correntes do governo. Mas o problema de gestão e falta de flexibilidade na administração dos recursos públicos continuaria a existir.
O Brasil precisa de mais investimento privado e menos gastos correntes do setor público. Somente assim poderemos crescer a taxas mais elevadas, mantendo sob controle a inflação. Esse é o caminho para modernizarmos a economia, melhorarmos a infra-estrutura e gerarmos mais empregos.
O setor público brasileiro é grande demais para ter sua eficiência abalada cada vez que se deseja cortar ou conter os seus gastos. O custo para a nossa economia é enorme.
O governo acertou ao priorizar a reforma da Previdência. Agora, cabe colocar no topo de suas prioridades a gestão de suas contas. O objetivo é uma maior flexibilidade na administração dos seus recursos e um maior retorno social para cada real gasto. Essa é a única forma de construir os alicerces do crescimento, preservando os contribuintes, satisfazendo os credores e gerando desenvolvimento sustentável para o Brasil.


Horacio Lafer Piva, 46, é o presidente da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp).


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