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Neutra
Independência ajuda planos de Marina Silva para 2014, mas a senadora terá de se mostrar capaz de transcender os limites do discurso verde
A neutralidade do Partido Verde -ou independência, como prefere Marina Silva- era previsível.
A candidata à Presidência já havia
manifestado inclinação nesse
sentido. Faltava-lhe apenas conter a vocação aderente de correligionários do PV. No final, por 88
votos a 4, a plenária nacional do
partido ficou com ela. Os quase 20
milhões de votos amealhados podem não ter contribuído para ampliar as bancadas da agremiação,
mas abrem perspectivas antes inimagináveis para a senadora e ex-ministra do governo Lula.
Enquanto seu eleitorado distribui-se, no segundo turno, entre
Serra e Dilma, mais para o primeiro do que para a segunda, está claro que Marina olha para 2014. Desse ângulo, faz sentido fortalecer-se como terceira via, evitando
atrelamento a um dos blocos da
disputa. Além disso, nem a petista
nem o tucano acataram a agenda
verde com mais convicção do que
se entregaram a postiças exibições de religiosidade.
A momentânea captura da discussão política pelo tema do aborto afetou a própria avaliação do tipo de voto dedicado à candidata.
A chamada "onda verde" foi atribuída por não poucos analistas a
uma maré conservadora. Segundo
a explicação, que não resistiu a
dados objetivos, os votos adicionais no PV teriam contemplado a
única postulante de fé inquestionável e adversária do aborto.
Marina parece ter sido vítima de
uma variante interpretativa do
"preconceito de classe" de que se
queixava Lula. Mulher de pele escura, ex-empregada doméstica,
nascida na Amazônia, alfabetizada na adolescência e firme na
crença evangélica só poderia ter
crescido na preferência de eleitores incultos. Nunca, na de jovens e
profissionais urbanos, de classe
média ou alta, sensíveis a propostas ambientalistas e ao discurso
por mais ética na política.
A mensagem da ambientalista
está impregnada de abstrações e
bom-mocismo, ninguém duvida.
"O novo milênio que se inicia exige mais solidariedade, justiça
dentro de cada sociedade e entre
os países, menos desperdício e
menos egoísmo", prega na carta
aberta que endereçou a Dilma e
Serra. Ressalte-se, também, que a
faceta "século 21" da senadora
destoa de posições principistas,
ou mesmo retrógradas, que assumiu, quando ministra, contra células-tronco embrionárias e alimentos transgênicos.
Seria sinal de miopia, contudo,
deixar de ver que na trajetória de
Marina suas crenças particulares
têm evoluído para se tornar mais
congruentes com as políticas que
advoga. O fulcro de sua proposta
está em reformular o conceito de
desenvolvimento, que doravante
implicaria novas formas de explorar os recursos naturais. Nessa linha, formou uma equipe competente e apresentou ao menos o que
se poderia chamar de um programa de governo.
Se conta com a força das ideias
cujo tempo chegou, como assinala em sua carta ao citar Victor Hugo, só o próprio tempo dirá. Marina terá quatro anos pela frente para demonstrar que é capaz de
transcender os limites do discurso
verde e de seu partido.
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