São Paulo, domingo, 19 de novembro de 2006

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Vestibular e inclusão social na USP

SUELY VILELA


No caso da USP, o maior contingente dos que não têm sucesso no vestibular é formado por alunos do ensino médio público


AMPLIAR O acesso dos jovens ao ensino superior público e de qualidade é um dos grandes desafios brasileiros. Esse é mais um dos antigos e graves problemas do país, amplificado nos últimos anos pelo vigoroso debate e pela mobilização da sociedade em torno da educação e de seu papel como fator de desenvolvimento e de inclusão social.
As universidades, premidas por esses movimentos e pela opinião pública, têm procurado responder ao justo clamor dos jovens excluídos. As respostas indicam que há um longo e difícil percurso até que alcancemos consenso sobre o complexo tema da exclusão social e sobre qual estratégia adotar para enfrentar esse desafio. A diversidade das experiências no país sugere que as universidades estão optando por adotar caminhos próprios.
Esse comportamento não deve ser indicador de divergências, de falta de rumos ou de coordenação do sistema de ensino superior. Prefiro atribuí-lo a fatores estruturais, como o uso legítimo da autonomia que a Constituição Federal lhes assegura. Deve-se também considerar a existência de diferenças entre essas instituições, que expressam as particularidades de suas trajetórias e as posições conquistadas no país e no exterior.
Assim, entra em cena o peso das culturas acadêmicas internas, que tendem a modelar a percepção e a reação de cada uma diante dessa e de outras questões. Finalmente, elas tendem a ser afetadas pelas características sociais e culturais do seu entorno, fator que influencia suas políticas de inserção local e regional.
No caso da USP, o maior contingente dos que não têm tido sucesso no vestibular é formado pelos alunos oriundos do ensino médio público.
É recomendável, portanto, que nossas políticas contemplem, de forma combinada, a expansão da oferta de vagas e a elevação da qualidade da escola pública. Ao mesmo tempo, e enquanto políticas afirmativas emergenciais, introduzir no vestibular mecanismos que favoreçam os alunos egressos da escola pública, dando-lhes melhores condições de disputa com os demais. Além disso, é essencial que essas políticas sejam aplicadas sem que se perca de vista seu objetivo primordial, que é o de manter sua reconhecida excelência no ensino e na pesquisa.
No tocante à expansão da oferta, demos um grande salto, graças a uma bem-sucedida parceria da USP com o governo do Estado, que resultou em um aumento de 40% das vagas nos cursos de graduação ao longo dos três últimos anos, programa de grande envergadura, envolvendo a expansão de cursos existentes, duas dezenas de novos cursos e dois novos campi.
Com relação à nossa atuação junto às escolas públicas, decidimos implantar, mediante convênio com a Secretaria de Educação, o sistema de avaliação seriada no ensino médio, que será dirigido às escolas que aderirem ao programa e prevê a aplicação de provas ao término de cada ano, com notas ponderadas que se agregarão aos resultados do vestibular. O que permitirá também que a USP possa atuar em áreas vitais para promover a elevação da qualidade do ensino nessas escolas.
Quanto ao vestibular, o programa adotado prevê um sistema de pontuação acrescida para os alunos da escola pública, equivalente a 3% na pontuação obtida pelo candidato na primeira e na segunda fase.
Simulações indicam que esse mecanismo tem condições de elevar de 23,6% para 30% o número de ingressantes oriundos do sistema público e que esse impacto deverá ser maior nas carreiras mais disputadas, como medicina, direito e jornalismo.
Também foram introduzidas mudanças de qualidade no vestibular, como a reorganização dos conteúdos programáticos das matérias, procurando enfatizar o raciocínio, a associação dos conhecimentos e a interdisciplinaridade.
Finalmente, estamos adotando medidas visando à expansão e ao aperfeiçoamento dos programas voltados para o apoio aos alunos ingressantes e oriundos da escola pública. Abrangem, entre outras, a concessão de bolsas de estudos, o aperfeiçoamento dos programas de assistência aos alunos carentes e até mudanças nas nossas rotinas, como o funcionamento adequado das instalações e dos serviços de apoio para os cursos noturnos.
Com isso, a USP demonstra sua disposição para oferecer alternativas que sejam capazes de enfrentar de forma responsável e eficiente o grave problema da exclusão social e cooperar para reduzir os efeitos perversos na questão do acesso de contingentes da sociedade no ensino superior público de qualidade.

SUELY VILELA , 52, doutora em bioquímica, é reitora da USP (Universidade de São Paulo).


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