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TENDÊNCIAS/DEBATES
São positivas as mudanças propostas pelo
projeto de novo Código de Processo Penal?
SIM
Ampliando o direito de defesa
LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO
TODAS AS propostas que visem
aprimorar a tramitação dos processos judiciais, sem violar as
garantias e direitos constitucionais,
são sempre muito bem-vindas, a
exemplo de grande parte das mudanças propostas para a reforma do Código de Processo Penal.
Fica a cada dia mais difícil assegurar os direitos constitucionais da presunção de inocência, da ampla defesa
e do contraditório na fase de investigação e julgamento, pois vem se consolidando uma cultura de excessos e
certezas no exercício da jurisdição.
Certamente o rito processual pode
ser abreviado para termos resultados
mais produtivos. Por exemplo, quando o magistrado se deparar com provas convincentes da inocência do réu,
poderia decidir sumariamente, a
qualquer tempo, sem precisar ir até o
final do processo.
Um dos avanços do novo do texto
do CPP nesse sentido é a criação do
juiz de garantias, que participaria
apenas da fase preliminar, vale dizer,
da investigação, e a quem caberia o
controle da legalidade dessa investigação criminal, assegurando os direitos e as garantias do investigado.
O juiz de garantias impediria a adoção de qualquer tipo de prática em desacordo com a ordem jurídico-constitucional, cabendo-lhe decidir sobre
decretação da prisão preventiva, quebra de sigilo, interceptação de conversas telefônicas etc. Não será permitido pelo projeto que o juiz de garantias
presida o processo judicial. Ele teria,
entre suas atribuições, a de decidir sobre as medidas cautelares que dizem
respeito à esfera de liberdade do acusado antes do processo.
O novo projeto amplia os mecanismos de restrição impostos ao investigado, apresentando alternativas para
o juiz substituir o encarceramento,
utilizando a cadeia com mais parcimônia. As medidas abrangem suspensão do exercício de função pública, veto para frequentar determinados lugares, comparecer periodicamente em juízo e monitoramento
eletrônico, entre outras.
Os Estados Unidos e países europeus têm realizado reformas em suas
legislações penais com o intuito de separar o juiz que investiga daquele que
julga. Dessa forma, vêm assegurando
a imparcialidade e a legalidade das fases de investigação e do processo penal, bem como garantindo de forma
mais efetiva os direitos dos acusados.
Sem dúvida, a inovação do instituto
juiz de garantias é mais condizente
com a tendência do direito penal contemporâneo em todo o mundo. Com a
atuação de dois juízes, teríamos visões distintas. Uma controlando judicialmente a investigação, e a outra
examinando as provas para decidir
sobre a vida do réu.
Ao longo dos 70 anos de vigência do
CPP, essa é certamente uma das mudanças mais revolucionárias e que,
por isso mesmo, encontrará mais resistência pelo seu caráter inovador,
de quebra de paradigmas.
Se o juiz das garantias é um passo à
frente no curso do processo penal, encontramos na contramão desse avanço a proposta de ampliação da intervenção do Ministério Público na fase
de investigação, que cabe exclusivamente à Polícia Judiciária.
Tal premissa não tem fundamento
constitucional e causaria um desequilíbrio no sistema jurídico-penal brasileiro, porque aquele que investiga
tem de manter sua imparcialidade.
Haveria grande conflito, porque o Ministério Público seria guindado a investigador e acusador ao mesmo tempo, seria parte na ação penal e teria
interesse direto na condenação, o que
não é salutar para o Estado de Direito.
Certamente, o projeto de reforma
do Código de Processo Penal tem
uma longa trajetória a cumprir no
Congresso Nacional, trazendo muitos
outros aspectos inovadores desse importante diploma legal.
Esse processo de análise, crítica e
reflexão deve ser aprofundado muito
além deste texto, que aborda poucos
tópicos de um projeto amplo e complexo, pela importância das modificações que introduzirá na ordem jurídica nacional. O novo projeto deixa a lição de que a realização do direito não
segue um frio critério de lógica formal
e da regra jurídica, mas vai além, busca os interesses maiores da justiça.
LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO , advogado criminalista,
mestre e doutor pela USP, é presidente da OAB-SP (seccional paulista do Ordem dos Advogados do Brasil).
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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