São Paulo, sexta-feira, 20 de abril de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Dengue, responsabilidades e desafios

LUIZ ROBERTO BARRADAS BARATA

No controle da doença, é contraproducente procurar culpados; todos somos responsáveis, incluindo as três esferas de governo

VAMOS direto ao ponto: a dengue é uma doença grave que está cada vez mais perigosa e pode, em alguns casos, até matar. Isso em todo o mundo.
A doença hoje é rotineira em mais de cem países, na América, na Ásia, na África e na Oceania. O mosquito transmissor da dengue tem no clima tropical um ambiente favorável para se reproduzir em progressão geométrica -e isso vem acontecendo.
Como o vetor está cada vez mais adaptado aos centros urbanos e ao inimaginável aumento dos resíduos sólidos (lixo e entulhos), favoráveis à sua reprodução, erradicá-lo é uma tarefa muito difícil.
Desde os anos 80, o Brasil convive com a dengue causada por 3 dos 4 tipos de vírus existentes. O sorotipo 3 do vírus da dengue atualmente predomina no território nacional e causa sintomas mais intensos nas pessoas infectadas, principalmente naquelas que estão adoecendo pela segunda vez. Some-se a isso o calor intenso, decorrente das mudanças climáticas do país (aquecimento global), aliado às chuvas tradicionais do início do ano, e teremos um cenário propício para o avanço da doença, como de fato vem ocorrendo.
Até 26 de março, conforme boletim divulgado pelo Ministério da Saúde, foram notificados 134,9 mil casos de dengue no país, 55 mil deles no Estado do Mato Grosso do Sul.
No Estado de São Paulo, onde vivem 41 milhões de pessoas, 22% da população brasileira, houve 20,3 mil casos de dengue, até 13 de abril. Desse total, quase a metade -8,8 mil- concentrada nas regiões de Araçatuba e São José do Rio Preto, próximas à divisa com o Mato Grosso do Sul.
O número de casos entre os paulistas neste ano é 27% inferior ao registrado no mesmo período de 2006, quando foram confirmadas 27,9 mil ocorrências.
Apesar da diminuição, que é importante, nem de longe podemos descuidar do combate ao mosquito. Neste ano, já ocorreram oito óbitos por dengue, dos quais seis da forma hemorrágica. Em 2006 foram 14 óbitos em todo o Estado. Estes dados evidenciam a necessidade de redobrarmos os esforços para o combate à doença.
É bom ressaltar que, no controle da dengue, é absolutamente desnecessário e contraproducente ficar procurando culpados pelo avanço da doença. Obviamente, todos somos responsáveis, incluindo os dirigentes das três esferas de governo.
Trata-se de uma questão delicada, de mudança de hábitos, uma vez que 80% dos criadouros do Aedes aegypti (mosquito transmissor) estão no interior das casas das pessoas.
Se, em um quarteirão, apenas um único imóvel estiver com a caixa d'água destampada, tornando-se foco de criação do vetor, toda a vizinhança estará ameaçada.
O controle do mosquito transmissor é uma atividade primordialmente individual (criadouros residenciais) e municipal (lixo urbano), ou seja, de responsabilidade do cidadão e das prefeituras.
O Ministério da Saúde e as secretarias estaduais realizam atividades de apoio, auxiliando o financiamento das atividades, capacitando profissionais e dando suporte ao trabalho de campo das prefeituras.
A Secretaria de Estado da Saúde reservou, neste primeiro semestre, cerca de R$ 20 milhões exclusivamente para combate à dengue e o ministério irá repassar diretamente aos municípios paulistas mais de 40 milhões para o controle de doenças.
Em janeiro deste ano, cerca de 400 agentes foram contratados para reforçar o apoio às equipes municipais durante o verão em regiões consideradas prioritárias. Agora, em abril, a Superintendência de Controle de Endemias abriu concurso para ampliar seu quadro fixo de agentes de saúde em mais 119 profissionais.
Também neste início de ano foi consolidado o Comitê Estadual de Mobilização contra a Dengue, envolvendo 35 órgãos governamentais, empresariais e da sociedade civil em ações de prevenção à doença. Em 31 de março promoveu-se um "dia D" em todo o Estado, com atividades de alerta e combate ao mosquito, como visitas casa a casa, retirada de entulhos e distribuição de panfletos em cerca de 500 municípios infestados.
Em parceria com a Polícia Militar, a secretaria lançou, neste mês, um Esquadrão Especial Antidengue, com 60 profissionais da Sucen treinados para atuar em cidades com alta incidência da doença. A primeira ação do esquadrão e da prefeitura aconteceu na semana de 16 a 20 de abril, no município de Sumaré, com atividades de nebulização -para atacar mosquitos adultos-, vistorias em imóveis e orientações à população.
Todas essas iniciativas, embora fundamentais, serão insuficientes para conter a dengue se não houver o devido envolvimento dos cidadãos, paulistas e brasileiros, no que se refere aos cuidados diários para evitar recipientes com acúmulo de água limpa e parada em seus imóveis.
Somente desta forma o controle da dengue terá resultados mais efetivos, evitando-se novas internações e mortes pela doença.


LUIZ ROBERTO BARRADAS BARATA, 53, médico sanitarista, é secretário da Saúde do Estado de São Paulo.

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