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Genoma humano, 10
Leitura do código genético da espécie transformou a pesquisa biológica, mas não cumpriu todas as suas exageradas promessas
No próximo sábado completam-se dez anos da apresentação
da sequência do genoma humano, ou o que se tornou conhecido
como mapa genético da espécie.
As expectativas sobre a façanha
científica, contudo, ainda estão
por ser cumpridas.
Não faltaram pompa e retórica
na cerimônia realizada em 2000,
na Casa Branca, com o presidente
americano Bill Clinton e o premiê
britânico Tony Blair. Ela serviu para pôr um ponto final na corrida
por prioridade entre o grupo financiado por recursos públicos de
vários países, representado por
Francis Collins, e a empresa Celera, de Craig Venter.
Nenhuma das equipes concorrentes, àquela altura, obtivera
mais que um rascunho da sequência. Os artigos científicos só seriam publicados sete meses depois, já em 2001.
Fazia mais de uma década que
os pesquisadores da iniciativa oficial, o Projeto Genoma Humano
(PGH), decifravam e posicionavam cada uma das 3 bilhões de
unidades químicas ("letras", na
analogia do código). Levariam
anos na tarefa, não viesse o azarão
Celera correndo por fora.
Para justificar um orçamento
estimado em US$ 3 bilhões, o PGH
prometia uma revolução na medicina. A ideia era que, conhecido o
conteúdo de cada um dos mais de
20 mil genes nos 46 cromossomos
humanos, os mecanismos bioquímicos de todas as doenças terminariam desvendados.
Francis Collins afirmou na ocasião que em dez anos haveria testes genéticos para diagnosticar as
moléstias mais importantes, como
tumores, diabetes e Alzheimer.
Mais cinco anos e uma nova geração de tratamentos surgiria. Bill
Clinton disse já ser concebível que
seus netos só viessem a conhecer
o câncer como uma constelação
de estrelas no céu.
Tais metas permanecem inalcançadas. Falhou a hipótese de
que as raras variações individuais
-trocas de letras- no genoma
ajudariam a identificar doenças e
curá-las. Mesmo as associações
estatísticas entre genes e moléstias estão presentes numa parcela
ínfima de portadores. Estudos recentes revelam que métodos convencionais, como o histórico familiar, podem ter maior valor preditivo que o escrutínio de genes.
Nem sequer o diagnóstico avançou, até aqui, com a genômica. E
não chegaram, tampouco, ao menos na quantidade imaginada, os
remédios que deveriam brotar do
conhecimento obtido.
Em que pesem essas frustrações, não se deve concluir que o
Projeto Genoma Humano tenha
sido um equívoco ou um fracasso.
A genômica de fato transformou a pesquisa em biomedicina,
agregando-lhe uma panóplia de
novas tecnologias, cujo custo vem
caindo vertiginosamente. Se o primeiro genoma custou US$ 3 bilhões, hoje já se pode sequenciar o
de um indivíduo por US$ 5.000.
Uma ou mais décadas poderão
ainda ser necessárias para processar a enorme massa de informações sobre genes gerada em dez
anos. Como sempre, os pesquisadores estão otimistas.
É justo e recomendável dar-lhes
o tempo de que precisam, desde
que em troca se disponham a calibrar melhor sua retórica, desfazendo esperanças desmesuradas
nas biotecnologias.
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