São Paulo, segunda-feira, 20 de setembro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Universidades de pesquisa no Brasil

ROBERTO LEAL LOBO E SILVA FILHO

Nem todas as instituições de ensino superior (IES) são universidades. Nem todas as universidades são universidades de pesquisa. Nem toda a universidade de pesquisa realiza-a de forma intensa. Essa é a classificação de instituições de ensino superior feita pela Carnegie Foundation for the Advancement of Teaching, fundação americana muito conceituada, e que é utilizada pelas estatísticas oficiais sobre o ensino americano do National Center for Education Statistics.
As universidades que fazem pesquisa de forma mais abrangente, na classificação da fundação americana, são denominadas "extensive research universities", entre as quais, em 2000, situavam-se 151 instituições, sendo 102 públicas e 49 privadas sem fins lucrativos.
Para atingir o status máximo de universidade de pesquisa extensiva (entendida como uma instituição que, além de realizar a pesquisa intensa, transborda/ transfere-a, também intensamente, por meio de sua produção e formação de recursos humanos no doutoramento), a IES tem que demonstrar, por critérios concretos e quantitativos, que realiza pesquisa científica como foco fundamental e muito bem desenvolvido, apresentando pelo menos 15 programas de doutorado e realizando ao menos 50 defesas de tese anualmente nesses programas.
Utilizando os mesmos critérios da Carnegie Foundation e os dados gentilmente fornecidos pela Capes, foi possível identificar as instituições de ensino superior brasileiras que preencheriam os pré-requisitos da fundação americana. Fizemos esse levantamento em dois momentos, a partir dos cursos reconhecidos e avaliados como satisfatórios pela Capes (nota igual ou superior a 3), compreendendo os resultados separados por cinco anos, de 1998 e de 2003.
No primeiro levantamento, a USP liderava, com 156 áreas de doutorado e 1.431 defesas de tese, em 1998, seguida pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), com 51 áreas de doutorado e 397 teses, depois a Unicamp e a Unesp, seguida de três universidades federais -Unifesp, UFRGS e UFMG-, completando a lista a PUC-RJ, com 16 áreas e 84 teses.


É muito importante que uma parcela das instituições de ensino superior tenha a pesquisa como seu principal foco


Verificou-se, em 2003, um grande crescimento do número de instituições que satisfaziam aos critérios de universidades de pesquisa extensiva, que passaram de oito para 16, quase todas universidades públicas, com exceção das PUCs do Rio e de São Paulo.
A USP continuou mantendo quase o triplo de áreas de doutorado e produção de teses que a UFRJ em 2003, passando para 188 áreas e 2.104 teses, contra 66 e 643, respectivamente, da UFRJ. Algumas universidades que estavam na primeira lista subiram, como a Unesp, para terceiro, vindo a UFRGS logo em seguida. A Unicamp obteve o quinto maior número de áreas, apesar de ser a segunda em número de teses (738), seguida da UFMG, da Unifesp e da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), que não estava na primeira lista, mas em 2003 chegou entre as oito universidades com maior número de áreas de pesquisa (30).
A partir daí, a lista inclui, além da PUC-RJ, sete outras universidades que só atingiram os critérios da Carnegie Foundation em 2003, sendo seis federais e uma PUC. Pela ordem: UnB, UFPR, UFSC, PUC-RJ, UFF, UFV, UFBA e PUC-SP -que possuía em 2003 exatamente as 15 áreas necessárias, com 313 defesas de tese.
Além do número de universidades de pesquisa extensiva ter crescido, houve uma nítida descentralização geográfica desse tipo de IES. Enquanto, em 1998, sete das oito universidades situavam-se na região Sudeste e uma na região Sul, em 2003 dez situavam-se no Sudeste, a região Sul passou a ter três representantes, aparecendo o Nordeste com duas e o Centro-Oeste com uma IES. Os números de 2003 reforçam o crescimento verificado de mais de 50% da participação brasileira na produção de artigos científicos em revistas indexadas, tendo aproximadamente dobrado o número das publicações científicas e o de doutores formados.
Nos Estados Unidos, as universidades de pesquisa do tipo extensivo correspondem a 3,5% das IES que oferecem diplomas de graduação de quatro ou mais anos, enquanto no Brasil essa proporção é de 1%. No Brasil, tomando a mesma proporção que há nos EUA, poderíamos ter 56 instituições desse tipo, no universo de 1.584 IES (dados do Inep referentes a 2002).
O percentual de alunos matriculados nessas instituições é, no entanto, bem maior lá-são 14% do total de matrículas nos EUA e 10% no Brasil. Esses dados nos mostram que nem todas as IES num país podem se dedicar intensamente às atividades de pesquisa. No entanto é muito importante que uma pequena parcela das instituições de ensino superior tenha a pesquisa como seu principal foco, a fim de assegurar a produção sistematizada do conhecimento e a formação de cientistas, bem como abrigar os grupos de pesquisa produtivos, que é a missão das universidades de pesquisa extensiva.
Outra conclusão importante é a de que, apesar das dificuldades por que passam nossas IES, tanto públicas quanto privadas, a consolidação da pesquisa e da pós-graduação é uma realidade, principalmente no setor público -e, nele, no sistema federal de ensino e no sistema estadual paulista.

Roberto Leal Lobo e Silva Filho, 66, doutor em física pela Universidade Purdue (EUA), é diretor da Lobo & Associados Consultoria. Foi reitor da USP (1990-93) e da Universidade de Mogi das Cruzes (1996-99).


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